por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 06.11.2021

Tive já oportunidade, neste espaço, de deplorar a forma como, nas negociações político-partidárias que antecederam a votação do Orçamento do Estado, foram feitas, à revelia da Concertação Social, sucessivas e inadmissíveis cedências em matéria laboral, que conduziriam a um sério entrave ao desenvolvimento das atividades económicas.

Seria de esperar que, face à rejeição do Orçamento e ao anúncio, pelo Presidente da República, da sua decisão de dissolver o Parlamento, as propostas do Governo caíssem, o processo legislativo em curso neste domínio terminasse e se abrissem, assim, condições para retomar um caminho de diálogo com os Parceiros Sociais, na procura de reequilíbrios que salvaguardem a competitividade empresarial.

Ao arrepio destas expectativas, assistimos nos últimos dias a uma verdadeira voracidade na aprovação de nova legislação laboral na Assembleia da República, aproveitando o compasso de espera até à sua efetiva dissolução.

Algumas das matérias que agora são alvo da pressa legislativa dos partidos políticos não foram sequer objeto de apreciação em sede de Concertação Social, como seria obrigatório. Outras, que já tinham sido discutidas pelos Parceiros Sociais, são vertidas em legislação que adultera o que na Concertação Social tinha sido acordado.

Este não é, certamente, nem do ponto de vista político, nem do ponto de vista económico, o momento para se introduzirem alterações apressadas e irrefletidas na legislação laboral. Sobretudo, não é o momento para se acrescentar rigidez no mercado do trabalho, nem mais custos e encargos injustificados para as empresas.

As empresas estão a lutar com severos problemas financeiros, dado o longo período de profunda perda de receitas que a pandemia provocou (e ainda provoca, em alguns setores). Vivemos um contexto marcado pela instabilidade e imprevisibilidade dos mercados (veja-se o que está a acontecer nos mercados das matérias-primas e da energia). Está em risco a própria sobrevivência de muitas empresas viáveis.

O foco das preocupações das forças políticas representadas na Assembleia da República deveria estar na recuperação das empresas, na promoção da sustentabilidade do emprego e de condições propícias à geração de novos empregos.

Durante esta crise, testemunhámos como a flexibilidade e capacidade de adaptação foram trunfos para muitas empresas se transfigurarem e reconverterem a sua produção ou adotarem novas formas de chegarem aos mercados.

No futuro que se antevê após a experiência, traumática, mas rica em ensinamentos, por que estamos a passar, a flexibilidade e adaptabilidade de que as empresas portuguesas souberam dar provas serão vantagens competitivas cada vez mais relevantes nos mercados mundiais.

Tudo aconselharia a promoção de um enquadramento sócio laboral que contribua para potenciar esses trunfos, não que os ponha em causa.

Tudo aconselharia, no mínimo, prudência.

Prudência e respeito é tudo o que as empresas exigem aos deputados, nos últimos dias deste Parlamento.