A experiência defendida pelo Governo não foi amadurecida e aprofundada. Ignora a incerteza que atinge Portugal e o mundo. Acrescenta ruído a um ano de extraordinárias dificuldades.
Com menos de um mês cumprido desde a assinatura do acordo de competitividade e rendimentos e com as decisões tomadas nesse âmbito por concretizar, o Governo decidiu avançar extemporaneamente para a experiência da semana de quatro dias já a partir do próximo ano. A CIP — Confederação Empresarial de Portugal considera que o anúncio feito pelo Executivo em sede de concertação social é prematuro, desequilibrado e arriscado.
A medida — o projeto-piloto — é prematura porque não se encontra ainda pensada e amadurecida o suficiente de modo a poder representar, de facto, uma experiência útil para todos os parceiros. A discussão e análise das consequências deveria ter-se prolongado de modo a evitar erros que, sem a atual precipitação, seriam mais fáceis de evitar.
A medida é desequilibrada porque existem custos evidentes para as empresas, já que existirão menos horas de trabalho por colaborador e o mesmo peso salarial. A produtividade, embora não seja obviamente o único pilar a ter em conta, não pode ser excluída da decisão e do enquadramento a definir.
Existindo formas de encontrar o justo balanço, a ideia do Governo não resolve suficientemente a questão. Como tem sido habitual, o Executivo conta que grande parte do esforço seja suportado pelas empresas numa eterna multiplicação dos custos e encargos. A CIP alerta para o impacto na competitividade do país.
Finalmente, a medida é arriscada porque é lançada e executada num período de enorme incerteza económica em que os esforços de todos deveriam estar concentrados na resolução dos problemas urgentes que enfrentamos.
A conjuntura que Portugal tem diante de si — uma crise com múltiplas frentes — pede bom-senso e sentido de responsabilidade a todos os intervenientes. A crise energética, a inflação galopante, o aumento repentino e acentuado das taxas de juro e a falta de profissionais em diversos sectores são desafios complexos para os quais não existe uma solução mágica.
Neste sentido, lançar neste preciso momento de indefinição nacional e global a semana de quatro dias significa apenas acrescentar mais uma variável a um contexto que já é de máxima dificuldade. Significa também acrescentar mais ruído no debate público, transmitindo uma ideia errada: que 2023 será um ano fácil para os portugueses. Infelizmente, não vai ser assim, dizem todas as instituições internacionais, apesar de todos os esforços que os empresários e os trabalhadores estão a fazer.
A CIP sublinha que a semana de quatro dias, bem como os novos desafios do mercado de laboral — entre eles, a conciliação família-trabalho —, são assuntos que têm sido alvo de reflexão interna permanente, tendo sido elaborado, em dezembro de 2018, a pedido da CIP, um estudo nesse sentido pela Nova School of Business and Economics.
O tema exige disponibilidade e coordenação entre todos para que seja possível encontrar uma solução consistente que evite experimentalismos e os riscos inerentes para a competitividade e coesão-social. Sem empresas, não haverá emprego nem geração de riqueza para o país. É imperioso que o Governo tenha esta preocupação em conta quando intervém numa área tão sensível como o mercado de trabalho.