por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 31.12.2022

O ano termina com o Governo sobre pressão máxima. Um facto inesperado tendo em conta a maioria absoluta que o sustém. Os portugueses olham naturalmente com perplexidade para o que está a acontecer; e os empresários juntam-lhe o receio muito concreto de que a ligeira melhoria das perspetivas económicas para 2023 face a estimativas recentes possa, infelizmente, ficar comprometida, levando com ela uma parte da atividade económica.

Portugal enfrenta, como o resto da Europa, um surto inflacionário violento e prolongado. Sofre o impacto das taxas de juros a subir a um ritmo sem paralelo desde a criação do euro – e que apenas encontra comparação com os espinhosos anos 80 do século passado. Juntamos-lhe ainda as dificuldades logísticas globais, também com impacto nos preços -, e o ajustamento da procura face à oferta. A crise energética também continua bem no centro da mesa, apesar de o teto europeu ter, para já, ajudado a arrefecer o mercado.

É neste contexto de várias crise simultâneas – vários choques – que entramos em 2023. A estabilidade política é, por isso mesmo, fundamental para o nosso país. Sem ela, a pressão sobre o crescimento aumenta consideravelmente. Sem ela, os instrumentos de apoio público fundamentais para amortecer a crise e, desejavelmente, fortalecer a nossa economia, perderão poder de fogo.

A famosa “bazuca” europeia, também conhecida como PRR, foi aprovada em junho de 2021 e prevê um total de 16 444 milhões de euros de financiamento, dos quais 13 944 milhões de euros a título de subvenções. Como a CIP referiu desde a primeira hora, lamentamos que o PRR tenha sido sobretudo direcionado para as instituições públicas e não tivesse sido assumido como instrumento de transformação da economia nacional. Ainda assim, o plano tem de avançar sem mais demoras.

O mesmo deve ser dito em relação ao novo quadro financeiro plurianual, dotado de perto de 23 mil milhões de euros. Ora bem, o Portugal 2030 assume-se como um contributo decisivo para uma estratégia de desenvolvimento. No entanto, ficámos perplexos quando constatamos que o objetivo “Portugal mais competitivo e inteligente” apenas merece 23% do orçamento do Portugal 2030. Julgamos que o valor fica aquém do que o país necessita.
As dificuldades são, portanto, estas – compete-nos a todos começar o ano com o máximo de concentração e energia. Os problemas não se vão resolver sozinhos, pelo contrário, exigem esforço e compromisso entre todos os atores para aproveitarmos as oportunidades e debelarmos mais depressa as dificuldades que enfrentamos.
À entrada de 2023, deixo por último uma nota de preocupação: estão a ser comunicadas diversas situações em que o aumento salarial de 5,1% previsto no acordo de concertação social para a legislatura não está a ser aceite por algumas estruturas sindicais, que assim tentam introduzir instabilidade na economia. O ano vai ser difícil, não o tornemos impossível.