por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 05.12.2020

Apesar das suas considerações iniciais de que, graças à ação sem precedentes dos governos e dos bancos centrais, o pior foi evitado, e de que há, agora, esperança para um futuro melhor, o relatório sobre as perspetivas económicas da OCDE, divulgado esta semana, está longe de traçar um cenário favorável para os próximos tempos, sobretudo na Europa e, em particular, em Portugal.

Nele podemos ler que, após a retoma inicial de muitas atividades, o ritmo da recuperação diminuiu recentemente, sobretudo na Europa, onde, provavelmente, a produção terá mesmo voltado a cair. Na origem deste retrocesso está o recente ressurgimento da pandemia e as medidas de contenção implementadas, que estão novamente a enfraquecer a atividade em muitos países.

A produção deve manter-se persistentemente em níveis mais fracos do que o projetado antes da crise, levantando a ameaça de substanciais custos permanentes associados à pandemia.

Para Portugal, a OCDE aponta agora (em linha com as previsões do Governo) para uma contração da economia de 8,4% em 2020 (menos profunda, é certo, do que na sua projeção de 9,4% divulgada em junho), mas a intensidade da recuperação em 2021 foi significativamente revista em baixa, de 6,3% para apenas 1,7%, bem abaixo dos 3,6% previstos para a área do euro. A taxa de desemprego subirá, de acordo com estas previsões, até perto de 10%, no primeiro trimestre de 2021, antes de iniciar uma lenta descida.

Mais do que discutir as previsões, sempre falíveis, que aqui foram avançadas pela OCDE, importa sobretudo refletir sobre as grandes recomendações que este relatório contém para Portugal, resumidas nos três seguintes pontos:

Em primeiro lugar, ainda não é tempo de regressar à prudência orçamental: só quando a recuperação estiver bem encaminhada, de forma segura, é que o Governo deve proceder a uma retirada progressiva das medidas de apoio.

Em segundo lugar, a OCDE recomenda a ampliação de programas de aprendizagem e o reforço da formação em contexto de trabalho, para facilitar a realocação de trabalhadores na economia.

Finalmente, é dada particular importância à promoção de instrumentos de mercado com vista à recapitalização das empresas sobre-endividadas, mas viáveis, com vista a aumentar o seu potencial de crescimento e a minimizar o risco de repercussões negativas sobre o setor financeiro.

Além disso, contrariando uma visão meramente assistencialista dos apoios, é recomendado que os recursos sejam dirigidos às empresas mais produtivas, para permitir uma reestruturação progressiva da economia.

Nada disto é novo. Reflete justamente aquilo em que tenho vindo a insistir, persistentemente, nos últimos meses.

Se queremos contrariar as previsões sombrias que este relatório apresenta para Portugal e estimular uma recuperação mais sólida e duradoura, o caminho passa necessariamente por, sem mais atrasos, transformar estas recomendações em ações concretas.