Entendo este Programa, globalmente, como mais um passo na direção certa; aquilo que desejo é que chegue com urgência ao terreno.

Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 06.06.2020

Começam a ser conhecidos alguns indicadores económicos relativos a abril, que dão conta da profundidade e abrangência de uma crise fulminante, pronunciada e sem paralelo nos últimos cem anos, como a caracterizou o Conselho das Finanças Públicas.

O setor do turismo interrompeu quase totalmente a sua atividade, com reduções da ordem dos 97% no número de dormidas e de hóspedes.

Na indústria transformadora, o índice de produção caiu 29%, em termos homólogos, com alguns setores atingidos de forma particularmente intensa, destacando-se a queda de 80% na indústria automóvel.

No comércio a retalho, as vendas registaram uma variação homóloga negativa de 21,6% (34,3% no caso dos produtos não alimentares).

O pico desta crise, para muitas empresas, já terá sido ultrapassado. No entanto, se o seu início foi, de facto, fulminante, os sinais de melhoria são ainda muito ténues.

É verdade que a percentagem de empresas cuja atividade se encontra totalmente encerrada já está em regressão (de um máximo de 18%, no início de abril, para 8% na segunda quinzena de maio). Contudo, no inquérito do INE/Banco de Portugal, 84% das empresas reportaram uma estabilização ou uma variação pouco significativa do volume de negócios, entre a primeira e a segunda quinzena de maio, sendo que 14% ainda sentiram uma forte redução. Apenas 2% referiram que o volume de negócios aumentou muito.

Se, globalmente, o indicador de clima económico apresentou um ligeiro aumento em maio, os indicadores de confiança diminuíram novamente na indústria transformadora e nos serviços, prolongando as quedas abruptas registadas em abril e atingindo novos mínimos.

Outros indicadores menos convencionais, como o consumo médio de eletricidade, continuam sem dar sinais de melhoria significativa na atividade económica.

Tudo isto significa que não é ainda o tempo de interromper o que já se mostrava insuficiente face à dimensão da crise: é tempo, sim, de reorientar e reforçar medidas, ao mesmo tempo que se desenham estratégias para a recuperação.

Por isso, as quatro Confederações de Empregadores que integram a Comissão Permanente de Concertação Social afirmaram, a uma só voz, que, perante a realidade que vivemos e que podemos antever, não é, de todo, sensato retirar eficácia a instrumentos como o lay off simplificado, que vem assumindo uma utilidade e um impacto absolutamente vitais para evitar uma escalada brutal no desemprego.

Por isso, reconheço também a importância da generalidade das medidas anunciadas no quadro do Programa de Estabilização Económica e Social, que vêm, aliás, muitas delas, ao encontro das propostas que a CIP tem apresentado.

Entendo este Programa, globalmente, como mais um passo na direção certa; aquilo que desejo é que chegue com urgência ao terreno, encurtando o hiato que já se faz sentir, com o esgotamento de muitas das medidas tomadas numa primeira fase, deixando de fora milhares de empresas.

Espero, finalmente, que a passagem de uma lógica de emergência a uma estratégia de recuperação seja continuada e reforçada, sobretudo com um foco mais robusto, mais abrangente e mais ajustado num vetor fundamental: a capitalização das empresas.