por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 11.09.2021

Aumentos bruscos dos custos são o que as empresas mais dispensariam num momento em que ainda sofrem os efeitos da crise e necessitam de uma envolvente propícia ao regresso à rentabilidade, para poderem impulsionar a recuperação da economia.

Esta não é, certamente, a envolvente que se tem vindo a instalar, na sequência das convulsões dos mercados internacionais que têm causado escassez e aumentos violentos dos preços de matérias-primas e bens intermédios.

A situação tem sido mais visível na forma como a falta de semicondutores atingiu os construtores de automóveis, alastrando a toda a cadeia de fornecimento, mas também é grave em muitos outros setores, afetados pela escassez e elevados preços dos polímeros, metais, fibras têxteis, madeira.

Mais recentemente, assistimos a uma escalada dos preços da eletricidade, consequência, em larga medida, do aumento de preços do gás natural nos mercados internacionais, e da subida dos custos das licenças de emissão de CO2.

No mercado grossista ibérico (Mibel) sucedem-se os máximos históricos dos preços diários. No momento em que escrevo, noticia-se mais um recorde, acima dos 152€/MWh, quando há um ano o preço era inferior a 50€/MWh.

O Governo tem tranquilizado os consumidores domésticos, invocando a existência de muitas “almofadas” para evitar uma subida significativa dos preços finais, aguardando-se a apresentação pela entidade reguladora (a ERSE) da proposta tarifária para o próximo ano (prevista para 15 de outubro). No entanto, admite o impacto junto dos consumidores industriais, prometendo um pacote de medidas para mitigar o impacto dos preços altos no mercado grossista. De facto, as empresas que têm de renegociar agora os seus contratos de fornecimento são confrontadas com aumentos brutais da fatura de eletricidade.

É certo que situação atual se estende a todos os países europeus, embora seja mais grave no mercado ibérico, estando os fatores que lhe estão subjacentes fora do nosso controlo. A solução, por mais que se queira, não é só nacional.

Justifica-se que se repensem as regras de mercado no que respeita ao preço de fecho dos leilões diários, que foram concebidas numa altura em que, ao contrário do que sucede agora, as licenças de emissão de CO2 tinham um impacto muito limitado na formação desse preço. Não será, contudo, uma solução imediata nem milagrosa. A fixação de regras de mercado requer tempo para estudos e compatibilização de situações.

Mas o Governo tem outros instrumentos que pode e deve acionar para mitigar o impacto sobre as empresas, nomeadamente ao nível da redução da parcela fixa nacional do preço junto dos consumidores industriais, desde os chamados Custos de Interesse Económicos Gerais à dívida tarifária. O Governo pode, ainda, atuar nas condições legalmente fixadas para o autoconsumo e nos apoios ao investimento. Pode criar, com regras robustas, o estatuto de consumidor intensivo de energia, há muito esperado.

Não poderá haver lugar à demagogia, nem enveredar por soluções que impliquem custos acrescidos a prazo, mas há que responder com prontidão e eficácia a mais uma ameaça para as empresas e defender a competitividade da economia.