por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 03.09.2022

 

Afinal, a economia portuguesa não entrou em contração no segundo trimestre, relativamente ao primeiro, “apenas” estagnou (o comportamento das exportações e em particular do turismo compensou a queda da procura interna). Finalmente, a inflação recuou ligeiramente: 9,0% em agosto contra 9,1% em julho.

O economista-chefe do Banco Central Europeu diz-nos que não há sinais de uma recessão profunda na Europa. Os dados apontam para um abrandamento da economia, que pode implicar uma recessão moderada, mas não deverá ser demasiado dramático: é diferente de entrar numa fase de pessimismo.

Quando notícias como estas nos dão algum conforto, é porque, de facto, entrámos numa fase de pessimismo. Este pessimismo vai sendo alimentado por outras afirmações que tivemos oportunidade de ouvir, nos últimos tempos, vindas de diferentes paragens:

– O reputado economista Paul Krugman diz-nos que a contração económica nos Estados Unidos precisa de ser maior do que a atual para controlar a inflação.

– O Banco de Inglaterra alertou para uma longa recessão, que pode durar mais de um ano, a partir do último trimestre de 2022.

– Do Banco Central Europeu dizem-nos que, mesmo se entrarmos em recessão, não temos outra escolha que não seja continuar no caminho da normalização (ou seja do aumento das taxas de juro). Isto porque se houver a perceção de que os bancos centrais estão a baixar a guarda devido aos riscos para o crescimento económico, então corremos o risco de ver, mais à frente, uma correção mais acentuada.

– Finalmente, com grande repercussão nos media, o Presidente Macron declarou aos franceses (e não só) que estamos a atravessar tempos de grandes convulsões e de grande mudança e que chegou o tempo do fim da abundância: não só de energia, mas de matérias-primas e de água, de bens e de tecnologias que pareciam perpetuamente disponíveis, do dinheiro barato.

Este pessimismo que vivemos – e que eu próprio admito que alimentei quando, há dias, afirmei que a questão não é se vamos ter uma recessão, a questão é quando é que ela chega – não pode significar desalento. Não pode significar – muito menos – conformismo. Urge, por isso, olhar para a frente e mobilizar soluções concertadas, na União Europeia e a nível nacional.

Em França, a crítica mais certeira às afirmações do Presidente foi a de que uma constatação não faz uma política.

Como afirmei, não há uma bala de prata, mas a política económica importa, podendo e devendo ser manejada de forma a contrariar evoluções indesejadas. A inação não é resposta e não bastam meias medidas ou paliativos.

Se da política monetária já não podemos esperar qualquer alívio (bem pelo contrário), é tempo de redirecionar a política orçamental num sentido mais favorável à atividade económica, tanto pela via da fiscalidade como pela do investimento.

Quando o vento muda, não podemos limitar-nos a segurar o leme e fechar os olhos: é preciso manobrar e ajustar as velas.