por Armindo Monteiro, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 17.07.2023

As palavras por vezes gastam-se ou assumem significados que traem ou fragilizam o seu alcance. Elite é uma dessas palavras que nos habituámos a ler ou ouvir com uma dose reforçada de suspeita. Parece indicar um grupo de pessoas privilegiadas – pelas mais diversas razões – que usam essa vantagem apenas para seu usufruto pessoal ou do grupo a que pertencem – excluindo, obviamente, todos os outros. E, no entanto, não deve e não pode ser assim. Pertencer a uma elite, seja ela económica, profissional ou outra qualquer, traz consigo um imperativo social que exige ser cumprido. Essa obrigação é simples: contribuir para a valorização do espaço público, acrescentar ideias e projetos que fortaleçam a vida em comunidade e favoreçam o desenvolvimento do país.

Quem exerce funções de representação política encontra-se na primeira linha do exercício dessa responsabilidade. Estou, no entanto, convencido que delegar em exclusivo este impulso vital nos partidos ou no governo ou no Parlamento – ou nos demais órgãos de representação popular – seja reduzir esta fundamental dimensão cívica a um esforço mínimo que reduz drasticamente as nossas hipóteses de prosperidade coletiva. É habitual dizer que ter elites fracas ou pouco empenhadas no bem comum geram um país igualmente fraco e incapaz de assumir as prioridades mais adequadas que cada circunstância exige.

O resultado está à vista de todos de diferentes maneiras. A suspeita injustificada com que se olha para o setor privado e a descrença que define a opinião que temos sobre tudo o que é público é uma manifestação da mesma doença. Nós, portugueses, excluímos a confiança do imaginário coletivo. Escolhemos não acreditar. Optámos por julgar, achar e opinar, colocando-nos demasiadas vezes como espetadores à margem das decisões, contributos ou iniciativas que poderiam corrigir o que não funciona ou que está simplesmente errado há demasiado tempo. Nunca como hoje a vida dos portugueses dependeu tanto das decisões de tão poucos. Infelizmente, todos sabemos que essas decisões podem ser o céu ou o inferno.

Não basta a uma nação – até uma nação com 900 anos de história – ter língua própria, território, fronteiras e leis que procurem regular as relações entre as pessoas e as empresas. É preciso mais, muito mais: é preciso construir e investir num desígnio comum que se revele capaz de projetar Portugal no mundo e, em simultâneo, tenha a força para garantir em permanência as condições que permitam a cada pessoa concretizar o seu potencial e a sua vontade. Este desígnio nacional não surge do nada. Exige a construção de um consenso robusto e pede a procura constante de um compromisso ambicioso, não apenas de um acordo baseado no mínimo denominador comum. As fundações deste desígnio nacional têm de ser construídas sobre uma sólida base de confiança e respeito pela singularidade e diferença de cada pessoa. Respeito pelo trabalho dos professores, dos políticos, dos intelectuais, dos empresários… respeito pela coisa pública, respeito pelo dinheiro dos contribuintes.

Claro, este desígnio é tão mais forte quanto for o envolvimento de cada pessoa e, por isso, não se constrói de barriga vazia. Conscientes das dificuldades que as famílias atravessam, nós, empresários, assumimos a nossa responsabilidade. Queremos estar do lado certo da história. Queremos mudar a narrativa (errada) que conta aos portugueses que as lideranças empresariais só defendem uma economia de baixos salários. É falso. As empresas poderiam fazer mais se o Estado não onerasse tanto o trabalho. A construção de um pacto nacional começa por aqui: fazer com que o rendimento do trabalho chegue às pessoas num valor mais próximo daquilo que é efetivamente pago pelas empresas – e que o Estado captura injustamente.