por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 17.10.2020

A propósito do Orçamento do Estado para 2021, afirmei, há um mês, que não estávamos em tempos de considerações de tática política, sendo necessário, antes, assumir uma estratégia económica com o objetivo de superar a atual crise e criar as bases para colocar definitivamente Portugal na rota do crescimento.

Lamentavelmente, o que li na Proposta de Orçamento do Estado apresentada esta semana à Assembleia da República foi tática política a mais e estratégia económica a menos.

Quando li que a primeira razão invocada para justificar que este orçamento apoia a economia e o emprego é o facto de os impostos não serem aumentados, perguntei-me se seria uma afirmação deliberadamente irónica, ou apenas algo que escapou a uma revisão menos atenta do texto. Seria possível que a mensagem dirigida às empresas, neste momento, fosse mesmo: Deem-se por felizes por, desta vez, não vos aumentarmos os impostos?

Quando continuei a ler e vi que a segunda razão invocada, com o mesmo objetivo, é a eliminação do agravamento das tributações autónomas no caso de prejuízos em 2020 ou 2021, (medida que, aliás, foi anunciada em junho e aparece, agora, limitada às PME), perguntei-me se não haveria, mesmo, neste orçamento, novas medidas, medidas mais robustas, numa estratégia de apoio à economia pelo lado da oferta.

Procurei, e não encontrei nada, além da majoração de 10% das despesas no âmbito de participação conjunta em projetos de promoção externa, para efeitos de apuramento do lucro tributável.

Mais alerta fiquei, quando li, ainda na lista de “apoios às empresas”, que o Crédito Fiscal Extraordinário de Investimento introduzido pelo Orçamento Suplementar vai ser descontinuado, já na segunda metade de 2021.

Confesso que as minhas expectativas não eram elevadas. Mas esperava que este orçamento refletisse, de algum modo, a exigência que recai sobre as empresas de resistirem e impulsionarem a recuperação.

Esperava, no mínimo, um simples sinal de que estariam a ser concebidos instrumentos na linha da proposta da CIP de criação de um fundo com vista à capitalização das empresas através de fundos de capital de risco.

Esperava que constasse desta Proposta de Orçamento, pelo menos, a medida que, neste espaço, tive oportunidade de qualificar como irrecusável: a possibilidade de dedução dos prejuízos fiscais gerados em 2020 e 2021 aos lucros já apurados nos últimos exercícios financeiros.

Mas nem mesmo essa medida foi acolhida – uma medida neutra, a médio prazo, ao nível das finanças públicas, testada e adotada com sucesso em muito países europeus e, inclusivamente, defendida pelo Prof. Costa Silva na “Visão estratégica” que ofereceu ao Governo.

Ao invés de apoiar as empresas no seu esforço por manter o emprego, o Governo envereda, agora, pela via da punição de empresas que se virem obrigadas a recorrer a despedimentos.

Não será, certamente, esse o caminho para impedir a escalada no desemprego.

Esse será, antes, o caminho para continuar a pagar o desemprego.