por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 29.01.2022

Notícias falsas, calúnias, boatos, não são novidade. Ao longo da História, têm sido arma para a ascensão e a manutenção no poder de ditadores. Criaram o ambiente propício à deflagração de guerras. Destruíram a reputação de muitas mulheres e homens honrados.

A diferença do atual contexto é o potencial de circulação de desinformação no ambiente online, com escala e rapidez praticamente incontroláveis. Este potencial encontra terreno fértil na falta de literacia e espírito crítico de quem não hesita, tantas vezes ingenuamente, em com um simples clique difundir indiscriminadamente o que “vem à rede” e alimenta as suas convicções ou indignações.

Escrevo hoje sobre este tema, na sequência do ataque de que fui alvo há dias numa rede social, tendo-me sido atribuídas declarações falsas, com o intuito de me denegrir e, comigo, os empresários portugueses. As declarações foram ardilosamente montadas, simulando a captura de ecrã do site de um jornal nacional, como se de um título verdadeiro se tratasse.

Não foi a primeira vez que me vi obrigado a desmentir declarações falsas e caluniosas, difundidas em redes sociais por atores sem escrúpulos que desconheço e que lamentavelmente permanecem impunes, protegidos pelo anonimato permitido por essas mesmas redes.

A reforma da justiça deverá ter como foco os cidadãos e a necessidade de restaurar a sua confiança nas instituições e no próprio regime democrático, mas não poderá deixar de incidir na justiça económica, na medida em que condiciona o regular funcionamento das empresas e as decisões de investimento.

Para levar a cabo estas reformas não basta estabilidade, é também preciso vontade política. Espero que o novo ciclo que se iniciar a 30 de janeiro nos proporcione ambas as condições.

Sei do esforço da União Europeia para combater estes fenómenos. Vários passos foram já dados nesse sentido. Precisamente nesta semana, foi proposta pela Comissão Europeia uma declaração sobre direitos e princípios digitais, que inclui o compromisso de “criar um ambiente online no qual as pessoas sejam protegidas contra desinformação e outras formas de conteúdo nocivo”. Um próximo passo importante será a adoção do Regulamento dos Serviços Digitais (DSA), que contempla a criação de um espaço mais seguro para utilizadores e empresas digitais, protegendo os direitos fundamentais online.

Entre nós, a Assembleia da República aprovou a Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital, que apesar de ter contado com uma larga maioria dos deputados (e nenhum voto contra) gerou grande polémica, precisamente em torno do artigo relativo à proteção da sociedade contra a reprodução ou difusão de desinformação.
Não quero aqui alimentar essa polémica. Não é fácil lidar com as redes sociais, em situações em que não é clara a fronteira entre censura e proteção dos cidadãos contra a desinformação. Como articular responsabilidade corporativa, autorregulação e intervenção do Estado na abordagem a estas questões? Não tenho receitas fáceis, mas é preciso encontrar soluções que permitam eliminar conteúdos ilegais com celeridade, travar a sua disseminação, identificar e responsabilizar os autores.