por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 02.04.2022

Mais de cinco meses após a rejeição do Orçamento do Estado para 2022, quase quatro meses depois da dissolução da Assembleia da República, dois meses decorridos após as eleições legislativas, temos, finalmente, um Governo no pleno exercício das suas funções. Um Governo com uma nova liberdade de ação dada pela maioria absoluta de que dispõe no Parlamento.

Na tomada de posse, foram elencados quatro grandes desafios de fundo para o futuro: desafios consensualmente reconhecidos, por sinal os mesmos que constavam no Programa do anterior Governo. Acrescentaria mais dois: o desafio da redução do endividamento, do Estado e das empresas, onde encontramos um forte constrangimento ao investimento; o desafio dos mercados globais, onde as empresas lutam, contra todas as adversidades, para explorar oportunidades para crescer.

A questão crítica, que definirá a capacidade de “escrever as páginas de um futuro que queremos radioso”, para utilizar as palavras do Primeiro-ministro, não será identificar desafios, mas definir uma estratégia para os vencer.

Para tal, é necessário começar por reconhecer o papel das empresas na construção desse futuro. Todos os grandes desafios de fundo que foram referidos estão profundamente relacionados com a produtividade das empresas, seja oferecendo oportunidades que, se corretamente exploradas, a podem potenciar, seja como condição para que sejam enfrentados com sucesso.

Por isso, a produtividade deve ser o objetivo prioritário, a variável-chave, de uma estratégia capaz de conduzir à transformação da economia, ao crescimento e à convergência.

Os recentes dados divulgados pelo Eurostat mostram que, nas últimas duas décadas, Portugal divergiu da média europeia. Sob o impacto da pandemia, essa divergência agravou-se. Os países que, no início do século, eram menos prósperos que Portugal, todos eles, sem exceção, conseguiram convergir. Seis deles já nos ultrapassaram.

Se persistirmos na inércia e na complacência, não poderemos esperar melhores resultados. Precisamos pois de uma estratégia de crescimento e de um ímpeto reformista que dê um novo rumo ao nosso país, removendo os obstáculos que nos têm impedido de crescer.

No imediato, precisamos de medidas urgentes, mas que tardam, para fazer face ao impacto da guerra sobre as empresas e a economia, impacto esse que está a ser perigosamente subestimado.

Ao desígnio de criar condições para a transformação da economia, para crescer e convergir, somam-se, na atual conjuntura, duas prioridades imediatas: a primeira, mais uma vez, é salvar as empresas e preservar o emprego, porque sem empresas e sem emprego nada será possível. A segunda prioridade é a de conter uma espiral inflacionista que se arrisca a tornar num constrangimento severo a qualquer estratégia de crescimento.

Encorajo, pois, o Governo a lançar mãos à obra, com sentido de urgência e, simultaneamente, visão de longo prazo, com ambição e com vontade, para que se dissipem as nuvens que ensombram o futuro radioso de que nos falou o Primeiro-ministro.