A CIP – Confederação Empresarial de Portugal, em parceria com a Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP) e com a Associação Portuguesa de Fundição (APF), organizou esta segunda-feira mais um webinar inserido no ciclo de encontros empresariais dedicado à Economia Circular, com o apoio da EY-Parthenon.

Com o novo Decreto-Lei que aprova o Regime Geral da Gestão de Resíduos prestes a entrar em vigor, no dia 1 de julho, o enquadramento regulatório é denunciado pelo setor como um dos principais entraves à circularidade, devido à elevada carga burocrática e custos associados. As empresas defendem, por isso, também a existência de fatores de discriminação positiva, desde logo, através de incentivos fiscais. Um apelo ao qual o Ministro do Ambiente e da Ação Climática se mostrou sensível.

João Pedro Matos Fernandes, que encerrou o debate,  diz não dúvidas quanto à abundância de materiais nas construções já existentes, “que ultrapassam largamente aquilo que são as nossas necessidades”. No entanto, o Ministro reconhece que “não temos um sistema orientado para tal”. E concretiza: “Não temos sequer um sistema fiscal que o beneficie. Eu gostava de poder dizer que é mais barato desconstruir um edifício e aproveitar o que ele lá tem para construir outro, do que encomendar ferro ou ir ao rio buscar areia para fazer as argamassas. Não é mais barato. E por isso muitas coisas têm que mudar também do lado de quem aqui está, havendo uma política fiscal que possa ser diferente daquilo que é ainda hoje”.

Na Silampos, empresa fabricante de loiça metálica em aço inoxidável, a completar 70 anos, a circularidade é assumida, quer através da sustentabilidade dos produtos, quer do prolongamento do seu ciclo de vida. Em 1961, lançaram a primeira panela de pressão em Portugal. Hoje, o produto é modular, o que permite a sua reparabilidade, e 100% reciclável. Através do seu serviço de assistência a pós-venda, é possível solicitar a reparação de módulos ou até agendar a recolha das peças em fim de vida. “Muitas vezes, chegam-nos panelas de pressão com 30 ou 40 anos de utilização que, com a substituição de uma ou outra peça, conseguimos restituir o tempo de vida do produto”, conta Célia Soares, da Silampos.

Além dos constrangimentos colocados pelo quadro legal, nomeadamente no que toca ao conceito de resíduo e aos requisitos e custos de licenciamento, a Silampos destaca ainda a falta de consciência da população para a necessidade de transição de uma economia linear para uma economia circular, o que causa constrangimentos em termos da seleção de produtos por parte do consumidor. “Continua a existir a prevalência do consumo em detrimento do serviço”. E Célia Soares deixa a questão: “Para quando alterações legislativas, por exemplo, para fomentar, do ponto de vista fiscal, a seleção de produtos mais circulares e mais sustentáveis?”.

Também na Aapico, empresa que trabalha exclusivamente para a indústria automóvel e exporta 100% da sua produção, os produtos são reciclados a 100%. O setor enfrenta, no entanto, uma dificuldade que se prende com a reutilização dos resíduos. “Na Aapico produzimos cerca de 31.000 toneladas de resíduos inertes que, caso avance a alteração à taxa de gestão de resíduos, estamos a falar de um custo de cerca de 700.000 euros, por ano. São valores com grande impacto nas organizações”, explica Helena Coimbra, da Aapico. E adianta: “Consideramos que a atual solução, que passa apenas pela valorização paisagística, não faz sentido. Se está provado que é um resíduo inerte, porque é que não temos a possibilidade de utilizar o nosso resíduo noutros setores, como na siderurgia, na pavimentação de estradas ou na construção civil?”, questiona.

E é precisamente esta simbiose entre setores que a Associação Smart Waste Portugal pretende fomentar, através do projeto “Be Smart, be Circle”. Luísa Magalhães representante desta associação, explica que se trata de uma plataforma online de subprodutos e desperdícios passíveis de serem utilizados por empresas de diferentes setores, principalmente dirigida às PMEs.

A adoção de práticas de circularidade é ainda incipiente, principalmente entre as PME. Claúdia Ribeiro, do Centro de Apoio Tecnológico à Indústria Metalomecânica (CATIM) destaca a importância de “apoiar e não taxar esta passagem a subproduto, de forma a fomentar a circularidade. É fundamental valorizar quem integra práticas de circularidade (…), nomeadamente através do incentivo fiscal à incorporação de matérias-primas secundárias”.

Ana Cristina Carrola, vogal do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), reconhece o obstáculo colocado pelos baixos preços das matérias-primas virgens na aceitação por parte da indústria dos subprodutos e dos resíduos desclassificados, mas não se compromete com quaisquer instrumentos económicos e fiscais. Antes, destaca o alargamento da recolha seletiva que, diz, terá impacto na quantidade e na qualidade do material reciclado. “Este é um dos fatores que julgamos que permitirá promover a aceitação das matérias-primas secundárias nos próximos anos”.

Como sublinhou Aníbal Campos, Presidente da AIMMAP, “a sociedade europeia está cada vez mais mobilizada para a implementação e consolidação de um novo paradigma de economia circular que substitua de uma vez por todas a lógica já há muito ultrapassada de um modelo de economia linear e a indústria ocupa um lugar central em todo este processo. A verdade é que não pode haver efetiva economia circular sem uma aposta prévia e consistente na promoção da indústria transformadora em geral e da indústria metalúrgica e metalomecânica muito em especial”. Filipe Vilas-Boas, Presidente da APF, reforçou esta mensagem e a importância de serem estabelecidos incentivos à utilização de matérias-primas secundárias como forma de melhorar o nível de circularidade das empresas do sector.