por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 13.03.2021
Tradicionalmente, no início de cada novo ciclo de programação, a simplificação do acesso das empresas aos fundos europeus é invocada como grande objetivo prioritário, tanto a nível europeu como a nível nacional.
No entanto, os resultados deixam sempre uma sensação de desilusão, havendo mesmo a assinalar, nalguns aspetos, um agravamento das razões de queixa das empresas.
Mesmo a desmaterialização dos procedimentos não parece ter tido as vantagens que prometia, já que à burocracia se aliou um verdadeiro labirinto informático, com plataformas pouco amigáveis, que acabam por dificultar a vida aos promotores de projetos, ao invés de a facilitarem.
As queixas das empresas prendem-se, sobretudo, com o desfasamento entre o tempo dos negócios e o tempo dos programas: somando o tempo de espera para a abertura das candidaturas com o tempo para conhecer o respetivo resultado e com o tempo para assinar o contrato, já passou o interesse e a oportunidade de realização do projeto. Há, depois, ainda, o tempo de espera para a avaliação de cada pedido de pagamento.
Além disso, houve que lidar, entretanto, com a cultura de desconfiança sistemática das entidades avaliadoras em relação aos investidores.
O desenho do Plano de Recuperação e Resiliência e o início de um novo ciclo de programação de fundos europeus são oportunidade para corrigir os problemas detetadas e adequar o funcionamento das estruturas e os processos à realidade das empresas e às suas necessidades.
Um aspeto a corrigir será o do excesso de especificidades e de restrições nos avisos de abertura de concursos, na vã tentativa de definir, em cada momento, os setores, as empresas e os negócios que mais contribuem para o dinamismo económico, a competitividade e a geração de mais valor. Acresce que esses avisos são limitados no tempo, segundo lógicas do lado da máquina administrativa, nem sempre conciliáveis com os timings das empresas e com as respetivas estratégias.
Haveria toda a vantagem em que os avisos fossem de banda larga e as candidaturas em contínuo, garantindo estabilidade e previsibilidade às empresas relativamente aos estímulos com que podem contar para impulsionar as suas estratégias.
Com avisos globais, com candidaturas simples e sujeitas a critérios objetivos, com processos ágeis, com notificações de decisão atempadas, os projetos teriam financiamento célere e seriam implementados muito mais rapidamente.
Além disso, a adoção de alguns princípios basilares contribuiria para uma maior eficácia de todo o sistema: nomeadamente, a aceitação dos elementos declarativos das empresas de forma automática, associada à orientação dos serviços para uma eficaz fiscalização da execução e a mecanismos de penalização severos para situações de falsidade de informação ou utilização fraudulenta dos fundos.
Em programas lançados recentemente (designadamente o APOIAR) foram já ensaiados procedimentos mais expeditos, fornecendo uma experiência a desenvolver para o futuro.
Aproveitemos, não só esta, mas toda a experiência de mais de 30 anos de fundos europeus; não queiramos reinventar tudo novamente, mas não deixemos passar esta oportunidade para corrigir problemas há muito identificados.