por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 01.01.2022

Os desafios estruturais que Portugal enfrenta não foram resolvidos nos últimos anos e isso está à vista de todos os que estão disponíveis para observar os factos com seriedade. As duas grandes crises que sofremos – a grande recessão ou pré-bancarrota e, agora, a pandemia -, expuseram ainda mais todas as nossas fragilidades, embora também tenham aberto a oportunidade de retirarmos ao Estado o excesso de protagonismo que insiste em ter na vida económica do nosso país. O dinheiro da bazuca teria seguramente esta capacidade transformadora, mas todas as decisões tomadas até agora apontam exatamente no sentido contrário, o que não deixa de ser frustrante.

Os empresários portugueses não baixam, no entanto, os braços; estão habituados a procurar as melhores soluções mesmo nos contextos económicos e financeiros mais espinhosos. No horizonte imediato surge, contudo, um novo desafio que também se pode transformar em oportunidade: será que o novo quadro político que se vai iniciar vai criar as condições necessárias para que a recuperação se consolide e dê até lugar a novo ciclo económico, marcado por um crescimento mais robusto, sustentável e duradouro?

Dito de outra maneira: os resultados que saírem das eleições de 30 de janeiro vão ajudar Portugal a inaugurar um ciclo político, económico e social mais virtuoso e próspero? Qual o risco de passarmos meses e meses presos no meio de intermináveis discussões partidárias incapazes de encontrar a convergência necessária para que o país avance e não perca mais tempo?

A retoma do consumo e da procura externa permitir-nos-ia encarar 2022 com algum otimismo, não fosse a escalada de custos de produção, além de graves problemas em abastecimentos indispensáveis à produção causados pela falta de matérias-primas e dificuldades nos transportes marítimos. Acresce ainda o tal risco de acumulação de situações de maior debilidade financeira, que podem traduzir-se num aumento de insolvências. Estes constrangimentos ameaçam as projeções que apontam para uma aceleração do crescimento económico para valores superiores a 5% em 2022.

Perante estas incertezas – a que se junta a pandemia – torna-se fundamental que existam condições de governabilidade de maneira a garantir estabilidade, real capacidade de reação e também o músculo necessário para iniciar as reformas de que o país necessita. Sem esta estabilidade, a gestão do PRR e do Portugal 2030 serão também muito difíceis. O que vai acontecer nas eleições deste janeiro terá, portanto, consequências durante o ano inteiro. Todos os portugueses têm de perceber o que está em jogo. Nunca é pouco, é verdade, mas agora os riscos são ainda maiores.