por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 14.05.2022
Foi apresentada nesta semana a nova versão do Acordo de Parceria – Portugal 2030, a aprovar pela Comissão Europeia, previsivelmente até fim de junho. Esta versão, datada de 4 de março, mas disponibilizada a menos de 24 horas da reunião onde foi formalmente apresentada aos Parceiros Sociais, revelou-se muito semelhante à que tinha já sido objeto de consulta pública e discussão com os parceiros sociais, em novembro do ano passado. Aliás, na sua apresentação não foram explicitadas as diferenças entre as duas versões ou quais os contributos entretanto recebidos que foram incorporados.
Em suma, poderá afirmar-se que houve auscultação dos parceiros sociais, mas escasso diálogo, sendo desconhecidos os resultados concretos dessa auscultação.
Dotado de perto de 23 mil milhões de euros para um período de sete anos, o Portugal 2030 assume-se como um contributo decisivo para uma estratégia de desenvolvimento que permitirá a retoma do caminho de uma convergência sustentável com a UE, aliada a padrões de coesão territorial e social no plano interno.
Seria de esperar que o Objetivo Estratégico designado como “Portugal mais competitivo e inteligente” fosse o preponderante. A competitividade, assente em ganhos de produtividade, é não só o fator decisivo para assegurar um crescimento mais forte e mais sólido, como a variável-chave para conciliar todos os restantes objetivos, numa perspetiva duradoura, de longo prazo. Contudo, este objetivo absorve apenas 23% do total do orçamento do Portugal 2030.
Como é sabido, a grande crítica que tenho feito ao PRR é o facto de não refletir a prioridade que deve ser concedida às empresas no processo de transformação da economia portuguesa.
No Portugal 2030, havia a oportunidade de compensar o desequilíbrio na alocação de verbas em desfavor do tecido empresarial. Sabemos agora que o total de apoios diretos e indiretos às empresas neste programa ficará por 25,8% do total. Ainda menos, afinal, do que os cerca de 30% previstos no PRR.
A escassez de verbas afetas às empresas é patente, por exemplo, na dotação para a formação de ativos, numa lógica empresarial: 400 milhões de euros, que comparam com os 5691 milhões de euros alocados ao Programa Demografia, qualificações e inclusão, que concentra o grosso dos recursos do Fundo Social Europeu. Esta dotação está longe de responder à prioridade que deveria ser dada à promoção da adaptação dos trabalhadores, das empresas e dos empresários à mudança, tendo em conta, sobretudo, os desafios das transições digital e climática.
Há ainda muito a fazer até que os diversos Programas e os respetivos instrumentos estejam aprovados e cheguem ao terreno. Espero que, nesta fase, haja mais diálogo com os legítimos representantes das empresas, para que, pelo menos no plano operacional, haja uma melhor adequação do Portugal 2030 à realidade do país e às necessidades das empresas.
Para já, podemos concluir que, como sempre, é exigida resiliência e capacidade de resposta aos privados; os recursos continuam, no entanto, a ser concentrados no setor público. O que nasce torto, raramente se endireita.