por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 19.12.2020

Em tempo de balanço deste ano terrível, seguramente o mais difícil nas vidas de tantos, gostaria de olhar para o que foi possível fazer de positivo, em vez de insistir em tudo o que nos deixou insatisfeitos e frustrados face ao que seria desejável e necessário.

Entre o que foi possível, está o esforço das empresas para sobreviver e salvar empregos, durante esta crise sem precedentes.

Nos primeiros nove meses do ano, a contração do emprego foi de 108 mil postos de trabalho: um número brutal, mas, ainda assim, menor do que o expectável e, em termos relativos (-2,2%), bem menos do que a queda na produção no mesmo período (-8,3%). Estes números revelam, acima de tudo, uma forte resistência das empresas em prol da preservação dos postos de trabalho. Mostram também, apesar das insuficiências e disfunções que denunciei aqui por diversas vezes, que os apoios dirigidos às empresas são a melhor e mais eficaz via para apoiar as pessoas e as famílias. Sabemos, por exemplo, que mais de três quartos das empresas teriam despedido sem o recurso ao mecanismo de lay-off simplificado.

Nestes meses dramáticos, fomos surpreendidos por situações inteiramente inesperadas, mas também por exemplos de adaptação célere por parte das empresas. Tal sucedeu, por exemplo, com a rapidez com que muitas empresas se mobilizaram para a produção de desinfetantes e material de uso médico, com grande benefício para todo o país. Tal sucedeu, também, com a procura de novos canais de distribuição, de novos clientes e mercados, recorrendo a ferramentas digitais ou a outras vias mais tradicionais.

Muitas empresas reorientaram os seus esforços para os mercados externos, incluindo para mercados de países terceiros, menos afetados pela pandemia do que a Europa. Mais uma vez, à semelhança da anterior crise, o setor exportador mostrou estar à altura e impulsionou o início da recuperação. As exportações de bens sofreram, na fase mais aguda da crise uma queda profunda (mais de 40% em abril) mas, registaram, logo a partir de maio, sinais de retoma, com contrações homólogas sucessivamente menores, estando já perto dos níveis observados há um ano (apesar de algum retrocesso em outubro).

Não quero, com esta visão, menorizar a gravidade da situação do país, nem, muito menos, desvalorizar o drama de tantos e tantos empresários, sobretudo em setores mais afetados pela crise e com menos oportunidades para reagirem e reinventarem as suas empresas.

Não esqueço que a recuperação registada em muitos setores está agora ameaçada e que, noutros, essa recuperação é ainda uma miragem.
Não retiro uma palavra às críticas que tenho feito à atuação do Governo em muitos domínios.

Quero, simplesmente, enaltecer as empresas que não desistiram e deram provas da sua resiliência em situações tão adversas.
Quero reconhecer o que de positivo foi feito, por empresas e organizações empresariais, mas também pelo governo e por muitas estruturas da Administração Pública, sempre que souberam trabalhar em conjunto pelos mesmos objetivos.

Quero afirmar que para consolidar e reforçar esses resultados – sempre insuficientes – é preciso manter vivo o sentido de coesão e solidariedade de todos – empresas, trabalhadores, governo, cidadãos – naquele que é, como costumo dizer, um jogo de seleção.