por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 25.12.2021

A Comissão Europeia apresentou, no dia 1 de dezembro, a sua estratégia para apoiar o desenvolvimento de infraestruturas em países terceiros. O projeto visa mobilizar 300 mil milhões de euros, entre 2021 e 2027 para investimentos sustentáveis em projetos de conectividade, nomeadamente infraestruturas digitais, clima e energia, transportes, saúde, ensino e investigação.

A Ponte Global (Global Gateway) é muito mais do que um simples apoio ao desenvolvimento. É frequentemente referida como a contra-estratégia à Nova Rota da Seda (ou Belt and Road Iniciative) lançada pela China em 2013, e que tem vindo a construir infraestruturas por todo o mundo. Mas mesmo esta leitura é redutora.

A Ponte Global é uma estratégia geopolítica, que será empreendida numa lógica de parceria com países terceiros, investindo em infraestruturas cruciais ao seu desenvolvimento. Requer também que os países aderentes respeitem o Estado de direito, padrões elevados de direitos humanos, sociais e laborais e regras internacionais de propriedade intelectual e contratação pública aberta. Promove, assim, os valores europeus no mundo e operacionaliza o soft power da União Europeia.

Neste processo, os interesses estratégicos da UE também não ficam esquecidos. Por exemplo, em projetos que ajudem a produção de hidrogénio renovável, o objetivo será igualmente que este hidrogénio possa depois ser comercializado a nível internacional sem restrições à exportação ou distorção de preços.

Críticos apontaram o dedo ao montante dedicado à Ponte Global, que foi buscar fundos a diferentes programas já existentes. Mas mais que os montantes envolvidos – que ainda são significativos – é relevante a forma como estes fundos serão usados. Como se sabe, a UE é o maior doador de ajuda internacional ao desenvolvimento, mas nem sempre os resultados têm sido os esperados. Temos assim duas melhorias significativas: fazer melhor com os fundos existentes; e transformar a ajuda ao desenvolvimento numa parceria. De acordo com a presidente Ursula von der Leyen, o objetivo é criar ligações, não dependências.

Implementar esta estratégia será certamente um desafio complexo. A vasta experiência da Comissão Europeia, do Banco Europeu de Investimento e do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento nestas matérias ajudará. Mas o seu sucesso está dependente do envolvimento do setor privado, que será fundamental para levar a cabo os projetos economicamente viáveis e mobilizar o investimento necessário.

Tenho vindo a tecer duras críticas ao excesso de legislação europeia e à falta de consonância de muitas destas propostas com a realidade das empresas. Mas que não restem dúvidas que considero a UE capaz de grandes feitos. No que se refere à Ponte Global, as minhas expectativas são altas. Esperemos que se possa implementar de forma eficaz, para que as expectativas que tem gerado em todo o mundo não venham defraudadas.