Com a inflação atual, o setor da saúde está a chegar a um ponto de rutura. Esta foi a conclusão manifestada por todos os participantes na conferência “O Valor Económico da Saúde”, que se realizou a 27 de outubro, em Lisboa, pelo Conselho Estratégico Nacional da Saúde (CENS) da CIP.

João Almeida Lopes, representante deste organismo, recordou que “a maior parte [das empresas] tem os preços regulados, o que significa que estamos numa sala com o pé direito sempre a diminuir.” E este cenário é particularmente grave num sector que, entre convencionados, cadeias de distribuição e logística, farmacêuticas, empresas tecnológicas, entre outros, “tem em termos de emprego dimensão quase semelhante ao sector público.”

Almeida Lopes mostrou total abertura para encontrar uma solução que seja equilibrada para todos: “Estamos completamente abertos e disponíveis para encontrar soluções com o público e o social. Para sermos capazes de aproveitar o potencial económico da saúde no sentido de fazer crescer o emprego e a saúde em Portugal”, anunciou o também presidente da APIFARMA. Um passo essencial, recordou, seria uma tutela conjunta entre Ministério da Saúde e Ministério da Economia.

O ministro da Saúde, Manuel Pizarro assegurou que “a saúde é uma prioridade para o Governo” por ser “também essencial para a riqueza nacional”.

Para Pizarro, “a situação das empresas exige medidas próprias, que tem a ver com custos energia, compensações que estão previstas em sede Orçamento do Estado para 2023”, como aumento dotação orçamental, mas também o reforço para mitigação da tradicional dívida do sector da saúde.” Para o governante, a redução da dívida “terá um impacto grande na relação entre o sector da saúde e toda a economia que o rodeia.”

Também o representante da pasta da Economia, João Neves, mostrou “disponibilidade” para criar valor na área da saúde, que “pode dar crescimento e capacidade de sustentação de uma evolução económica do país.”

Na abertura da conferência, o presidente da CIP, António Saraiva, insistiu na “urgência” de assumir a saúde como uma área económica, pelo que o sector da saúde não pode estar apenas sob a tutela do Ministério da Saúde. Para a Confederação Empresarial de Portugal, tem de haver intervenção do Ministério da Economia e do Mar. “Será também importante a participação do Ministério da Ciência e do Ensino Superior (devido aos ensaios clínicos e transição do conhecimento) e do Ministério dos Negócios Estrangeiros, pelas exportações e captação de investimento estrangeiro.”

É que, sublinhou António Saraiva, a saúde é uma “área estratégica para a economia e, consequentemente, para desenvolvimento do país.” E deu exemplos de quão essencial é este sector para “a sobrevivência” nacional: “Sem um sector industrial da saúde e serviços de saúde, não conseguiremos estar nas cadeias de valor, nem nos clusters de investigação e tornamo-nos genericamente menos atrativos.” É necessário agarrar esta “oportunidade que permitirá crescer de forma sólida e estrutural, com impactos a nível do emprego e das exportações.” E neste ponto, face à inflação, “a situação atual não é sustentável”, pondo em causa a continuidade das empresas da área da saúde.

Já durante o debate que se seguiu, Armindo Monteiro, vice-presidente da CIP, recordou que a capacidade de esforço destas empresas terá um fim. “Até agora está a ser feito por ilusão da margem, mas há um momento em que já não é sustentável.” A solução passa pela eficiência, disse, recordando a proposta discutida no seio do Conselho Estratégico Nacional de Saúde da CIP, de criação de um cartão único de saúde. “Não faz sentido, com recursos escassos, estarmos a repetir exames, meios de diagnóstico.” Uma ideia secundada por José Zorro Mendes, professor no ISEG: “Para termos uma economia mais eficiente e para haver concorrência sã sobre empresas de um sector, é suposto que a informação seja transparente, fluida. E aqui não é isso que acontece. Há sectores que se querem proteger inviabilizando dados de um doente – que à partida pertencem ao doente.”

Este é exatamente o ponto referiu o cirurgião José Fragata, com experiência profissional no privado e no público: “Nós não estamos todos na mesma velocidade. Não me serve de nada que haja um sistema eletrónico no meu hospital, mas que não fale com os outros.”

João Almeida Lopes definiu uma meta: “Seria um orgulho grande que chegássemos ao final da legislatura e tivéssemos dado um passo grande na digitalização da saúde em Portugal.”