por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 29.08.2020

A preservação do emprego deve permanecer a grande prioridade da política económica.

Em março, escrevia neste mesmo espaço que, do ponto de vista do interesse nacional, a palavra de ordem tinha de ser “garantir o emprego e salvar a economia”. Cinco meses depois, esta afirmação mantém toda a sua atualidade.

Ficou já para trás (pelo menos assim o espero) o pior momento quanto à contração da atividade económica, mas de acordo com todas as evidências, ainda não passámos a fase mais crítica no que diz respeito ao mercado do trabalho.

Em finais de julho, havia mais 91 740 desempregados registados nos centros de emprego do que em finais de fevereiro.  Este número não dará ainda plenamente conta da situação que vivemos, uma vez que as estatísticas do INE indicam que entre fevereiro e junho se terão perdido mais de 180 mil postos de trabalho, em termos líquidos. Além disso, não tenho dúvidas de que as repercussões da crise no mercado do trabalho ainda não se fizeram sentir plenamente.

A recuperação da atividade está a processar-se a um ritmo mais lento do que o desejado, com o volume de negócios das empresas ainda em níveis historicamente baixos, apesar das melhorias relativamente aos mínimos registados em abril. Com esta quebra ainda persistente nas receitas, muitas empresas não conseguirão fazer face às despesas fixas inerentes às suas responsabilidades contratuais. A margem de manobra de que as empresas dispõem em termos de tesouraria, por maior que seja, dificilmente resiste a um período tão alargado de contração profunda das receitas.

É certo que há apoios. Sabemos, por exemplo, que mais de três quartos das empresas teriam despedido sem o recurso ao mecanismo de lay-off simplificado. Com a descontinuação desta medida e a sua substituição por um quadro mais limitado de apoios que evitem a necessidade de despedimentos, temo que o desemprego dispare de forma intensa.

Neste quadro, a preservação do emprego deve permanecer a grande prioridade da política económica, no curto prazo. Articulando esta prioridade com o imperativo de longo prazo da qualificação e requalificação da força de trabalho, faria todo o sentido apostar fortemente em políticas ativas de emprego assentes na formação profissional dos ativos, tanto os que mantêm o vínculo laboral com empresas como os desempregados.

O que não fará sentido neste momento serão pressões para aumentos salariais, fora de qualquer racionalidade económica, para alimentar artificialmente o consumo. Os supostos benefícios que teriam sobre a procura interna seriam rapidamente revertidos por via da perda de rendimento inerente a um aumento ainda maior do desemprego, associado ao encerramento de mais empresas – que não aguentariam o esforço.

Procuremos antes defender os postos de trabalho, conscientes de que tal objetivo passa por evitar danos irreversíveis no potencial produtivo, garantindo que o maior número possível de empresas sobrevive às dificuldades e mantém a sua capacidade para impulsionar a recuperação.