por Armindo Monteiro, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 11.05.2024
E de repente a OCDE muda de tom, melhora as perspetivas de crescimento e sublinha que o comércio mundial vai mais do que duplicar em comparação com o ano passado e que a trajetória favorável vai não só manter-se como ganhar mais tração no próximo ano. Como todos sabem, não era exatamente isto que estávamos à espera. As previsões têm sido consistentemente negativas e pouco auspiciosas, aprofundando a incerteza que define o mundo de hoje, marcado por guerras que destroem vidas e desfazem as expectativas.
Acontece que a economia global, designadamente por causa dos Estados Unidos e da China, aceleraram, criaram mais emprego e estão a produzir e a exportar mais. Os dois blocos têm problemas, é verdade, não estão livres de solavancos e mais travagens – as eleições americanas são um grande se -, mas a resiliência que demonstram deve servir de exemplo e incentivo à União Europeia, claramente menos ágil e mais lenta a resolver os problemas que enfrentamos.
Em Portugal, o conflito político-partidário consome – em excesso – a atenção dos media e passa a ideia (errada) de que os equilíbrios parlamentares e as táticas de cada grupo são o alfa e o ómega que nos move e que mais nos deve preocupar. Obviamente, o contexto partidário nacional é espinhoso e volátil, nada está realmente assegurado; mas os portugueses estão cansados de tanto ruído no espaço público. Depois de uma participação massiva nas eleições de 10 de março, numa demonstração de civismo e de envolvimento democrático deveras extraordinário, mereciam outro resultado. Mereciam ter eleito partidos mais conscientes da responsabilidade que lhe foi atribuída com tanta esperança.
Bem sei que as substituições no topo de alguns organismos públicos provocam sempre alguma fricção, mas parece-me que a nossa atenção deveria estar mais centrada na substância, isto é, nas políticas públicas que de facto podem ajudar a desenvolver Portugal. A redução do IRS, uma alteração há muito aguardada pelos portugueses, está transformada num novelo de difícil compreensão para o cidadão normal. O que deveria ser relativamente simples e direto é, hoje, um campo de batalha partidária sem quartel em que os dirigentes partidários procuram deixar a sua impressão digital.
Mas há também boas notícias. Ontem, o Governo apresentou um plano para começar a resolver o gravíssimo problema da habitação. Há medidas, há metas, há planos e parece-me muito positivo o esforço de envolver plenamente o setor privado, sem deixar de reforçar o modelo cooperativo e sem esquecer o lado tributário do problema, isto é, avançando com a redução do IVA para os 6% nas obras de reabilitação e na construção – até ao fim da legislatura. Finalmente, o fim do arrendamento forçado, uma perigosa bizarrice nacional, parece-me um sinal de confiança e respeito pela propriedade privada que deve ser aplaudido. São ideias e projetos assim que nos farão avançar e que podem realmente ajudar a resolver os problemas que os portugueses enfrentam. Como já aqui escrevi há uma semana, cada um deve fazer o seu trabalho: o governo, governar; a oposição, fiscalizar. Tudo o que inverta estes papéis não serve o país que todos queremos ser. As previsões da OCDE abrem-nos o caminho, mas somos nós que temos de fazer o resto – temos de fazer acontecer.