por António Saraiva, Presidente da CIP, e Pierre Gattaz, Presidente da BusinessEurope
Publicado no Jornal Negócios a 18.02.2022

Nos tempos que correm, é inegável que os cidadãos e empresários europeus almejam um futuro verde, neutro em termos climáticos e socialmente justo. A questão é: como iremos conseguir atingir este objetivo? Teremos a força necessária para conduzir o nosso continente e o resto do mundo por um caminho em que fabricantes de automóveis, de aço, de cimento, companhias aéreas, produtores de energia, todas as nossas indústrias consumidoras de energia, tal como os cidadãos e famílias, sejam capazes de reduzir a pegada carbónica drasticamente?

Os nossos líderes políticos europeus trabalham agora na legislação europeia “Fit for 55” que, em termos concretos, significa que os países da UE vão ter de reduzir mais de 30% das suas emissões atuais de CO2 nos próximos oito anos – uma vez que ambiciona cumprir o objetivo de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa de 1990 a 2030 em pelo menos 55%.

Comparando isso com a queda de 12% nas emissões de CO2 da Europa devido à enorme desaceleração económica em 2020, fruto da pandemia de covid-19, pode entender-se a tarefa hercúlea que todos nós enfrentamos: criar, simultaneamente, um crescimento de qualidade e um futuro neutro em termos climáticos.

Portanto, tal significa, para as nossas empresas, terem a capacidade de fornecer, em quantidade suficiente, combustíveis de aviação sustentáveis às maiores companhias aéreas de baixo custo e de bandeira da Europa, garantindo que continuam a operar de forma lucrativa. Significa conciliar uma expansão massiva da mobilidade verde baseada em baterias de lítio, hidrogénio e combustíveis renováveis, reduzindo rapidamente as emissões de carros a gasolina e diesel, mantendo custos acessíveis para as famílias e sem desestabilizar os governos em toda a Europa. Significa uma onda crescente de renovação de edifícios, transformação de infraestruturas e eletrificação de processos industriais que podem mais do que duplicar a procura global de eletricidade até 2050.

Significa reforçar os preços das emissões de carbono através do Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE), sem eliminar milhões de empregos nas indústrias siderúrgicas, de alumínio, cimento ou químicas, para não mencionar os setores a jusante, que correm o risco de serem transferidos para fora da UE, onde a reduzida ambição climática permite produção mais barata, mas não necessariamente mais sustentável.

Pode parecer missão impossível, contudo, políticos e empresas podem fazer a quadratura deste círculo, se as condições forem bem estabelecidas. Primeiro, precisamos de aumentar o apoio público e reduzir os prazos de licenciamento e instalação para produção e distribuição de eletricidade limpa. Veja-se a energia eólica da UE: para responder aos requisitos “Fit for 55” da UE, é necessário que a capacidade de energia eólica da Europa cresça de 220 gigawatts para mais de 450 gigawatts até 2030.

Um licenciamento mais rápido permitirá fazê-lo enquanto se elimina gradualmente os combustíveis fósseis no setor de eletricidade. E será necessário utilizar todos os recursos – turbinas eólicas, energia solar, melhores redes, energia nuclear, hidrogénio, combustíveis renováveis, gás, armazenamento de energia, inovações de produtos – para concretizar a transição energética para zero emissões líquidas. No entanto, não podemos descurar a situação global. A Europa é responsável por 8% das emissões mundiais de CO2 e ambiciona reduzir a sua pegada climática muito mais rapidamente do que outras grandes economias, enquanto a transição climática só pode ser bem-sucedida à escala global. Significa que o CELE precisa de manter disponíveis para as empresas um número suficiente de licenças de emissão de carbono gratuitas, para evitar danos às nossas melhores indústrias da UE, enquanto os grandes emissores como os EUA ou a China mantiverem a sua pouca ambição climática. Isto é crítico, porque as empresas europeias devem ter capacidade para investir na sua própria transformação e, em última análise, produzir, sem carbono, aço, produtos químicos ou alumínio.

Além disso, significa que um Mecanismo de Ajustamento das Emissões de Carbono nas Fronteiras (CBAM, em inglês) deve ser testado com sucesso para ajudar a Europa a prevenir o risco de fuga de carbono e evitar a deslocalização da indústria para regiões mais poluentes.

Sem os instrumentos certos, qualquer governo na Europa enfrentará perdas de empregos e rejeição pública, especialmente porque muitas incertezas nos acompanharão até 2030. Será que a capacidade instalada de eletricidade renovável aumentará globalmente, como previsto, em mais de 60% até 2026, ou seja, o equivalente à atual capacidade global de produção de energia elétrica a partir de combustíveis fósseis e nuclear? E esse aumento de energia renovável será sustentado com os preços das matérias-primas a escalar globalmente? Os preços do polissilício, um dos componentes essenciais dos painéis solares, mais do que quadruplicaram desde 2020 e vimos aumentos acentuados nos preços do aço (até 50%), alumínio (até 80%) e cobre (até 60%). Os preços do gás aumentarão ainda mais ou o atual nível de preços será apenas transitório?

Para garantir o sucesso da transição ecológica na Europa, devem ser cumpridas duas condições complementares. Primeiro, precisamos de uma base industrial forte na Europa, com empresas competitivas. A grande maioria das soluções práticas para garantir a transição verde vem diretamente da indústria, e qualquer medida que reduza a competitividade das empresas europeias teria, portanto, um impacto negativo na transição ecológica. Em segundo lugar, a simplificação das novas regras do pacote “Fit for 55” deve ser uma prioridade. A complexidade regulatória é, de facto, inimiga da inovação, e inovação é o que precisamos para fornecer soluções futuras para o desafio climático.

Precisamos de aumentar o apoio público e reduzir os prazos de licenciamento e instalação para produção e distribuição de eletricidade limpa.