por António Saraiva, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 10.12.2022
O mercado único, um dos principais alicerces da construção europeia, celebra em breve o seu 30º aniversário.
Apesar dos princípios que lhe estão subjacentes – livre circulação de pessoas, mercadorias, serviços e capitais – estarem consagrados no Tratado de Roma, a dificuldade na tomada de decisões atrasou a sua implementação e foi sob o impulso de Jacques Delors que o processo da sua construção foi relançado, sendo hoje reconhecido como fundamental para a competitividade da Europa e instrumental para a nossa capacidade de absorver choques externos.
As suas vantagens são claras e estão bem documentadas: levou a um aumento de mais de 2,8 milhões de empregos, promoveu o comércio, o investimento, o crescimento e a atratividade da União Europeia.
Para além disso, é o instrumento através do qual os cidadãos europeus mais facilmente experienciam os benefícios de pertencer à União Europeia, nomeadamente através da facilidade com que viajam, estudam ou trabalham noutros Estados-membros.
Constituindo o mercado único o núcleo do processo de integração económica, beneficiando cerca de 450 milhões de consumidores, o seu bom funcionamento deve estar no topo das prioridades europeias.
Mas a realidade é que, 30 anos depois, ainda não está plenamente concluído. É preciso tornar mais efetivo o princípio do reconhecimento mútuo (nas áreas em que não existe harmonização) e eliminar a concorrência desleal decorrente de bens que não cumprem as regras europeias, mas que, por ineficácia dos controlos nas fronteiras externas, continuam a entrar no mercado europeu. As empresas ainda encontram diversos obstáculos ao alargar as operações para outros Estados-membros. A obtenção de informações e procedimentos administrativos são muitas vezes morosos e custosos, o que afeta sobremaneira as Pequenas e Médias Empresas.
Para que o seu potencial possa ser plenamente alcançado, é preciso eliminar as barreiras que ainda subsistem, contrariar a introdução de medidas nacionais que o fragmentam e avançar com determinação em domínios onde os “custos da não-Europa” são mais notórios, como a energia e a economia digital.
De acordo com estimativas da Comissão Europeia, remover as barreiras existentes, poderia trazer até 713 mil milhões de euros até ao final da década.
A presente crise apresenta novas ameaças, uma vez que, na ausência de uma verdadeira resposta conjunta, a disparidade de apoios à economia por parte dos diferentes Estados-membros põe em causa a concorrência equitativa no seio do mercado único – condição sine qua non para o seu bom funcionamento.
A celebração dos 30 anos deve, assim, marcar a retoma de uma verdadeira agenda para o mercado único, para dar à União Europeia uma força que ainda desperdiça, em larga medida, quando não é capaz de pensar e agir como um todo coeso e dinâmico.