por Armindo Monteiro, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 06.05.2023
O ano de 1966 foi realmente excecional. A seleção masculina de futebol conseguiu a melhor qualificação de sempre em Mundiais, o que na verdade, à época, era quase um facto normal, como era também habitual que nascessem mais de 200 mil bebés por ano em Portugal. Em 1967, no ano seguinte, nasceram 202 061 crianças, um número elevado que permitia substituir gerações à medida que o tempo passava.
A partir daí, os registos demonstram, no entanto, que foi sempre a cair: baixámos definitivamente para os dois dígitos na década de 2010. A grande recessão castigou severamente as expectativas e isso refletiu-se na natalidade. O maior salto negativo aconteceu nesses anos difíceis: em 2010 nasceram 101 mil pessoas, em 2013 apenas 82 mil, uma redução de 20 mil.
A queda, contudo, já vinha do final dos anos 60 do século passado. Foi em 1982 que deixou de haver substituição de gerações, ou seja, 2,1 nascimentos por mulher em idade fértil, o valor mínimo para que isso aconteça. Hoje nascem por ano cerca de 80 mil crianças no nosso país. Vejam como estamos longe das 202 mil de 1967. Uma queda incrível. Como se costuma dizer na NASA: Houston, temos um problema. Um grande problema. Menos nascimentos, menos pessoas, menos trabalhadores, menos produção, menos capacidade de criar riqueza e menos descontos para a Segurança Social, o que terá a prazo consequências muito complexas de resolver.
No meio deste cenário problemático, é importante sublinhar que Portugal tem hoje mais habitantes do que tinha antes do 25 de abril. Nos anos de 1960 a 2021, a população em Portugal aumentou de 8,86 milhões para 10,33 milhões. Isto significa um aumento de 16,6% em 61 anos. A natalidade deu um forte contributo para este salto, além do prolongamento acentuado da esperança média de vida, que acompanhou o progresso do país desde os anos 70. Quando a natalidade entrou em crise, passou a ser a imigração a contribuir positivamente para o saldo demográfico – isto apesar de a emigração ser hoje uma escolha novamente habitual nas gerações com menos de 40 anos, especialmente entre os mais qualificados, por causa da eterna crise económica que nos acompanha.
Temos, portanto, um problema que, de resto, afeta a quase totalidade das economias mais desenvolvidas. A Alemanha, por exemplo, acaba de lançar um programa global que se chama “You Can Make It In Germany”. O que é? Simples: estima-se que em 2030 faltem oito milhões de trabalhadores à economia alemã. Ora bem, para atrair pessoas de todo o mundo, o governo do sr. Sholtz vai aliviar a carga burocrática que trava a imigração extracomunitária e vai pôr de pé programas de apoio para imigrantes de modo a que a integração na sociedade alemã aconteça de forma mais suave – o objetivo é evitar os erros cometidos na década de 70 e 80, quando a forte imigração turca não foi totalmente bem recebida.
Volto, então, a Portugal. O inverno demográfico está instalado – é fundamental que um conjunto de políticas públicas bem direcionadas comecem a corrigir este problema. A imigração que nos tem ajudado terá de ter condições favoráveis e idênticas para todos de forma a não gerar um sentimento de desigualdade entre os portugueses.
Finalmente, julgo ser fundamental atrair pessoas qualificadas, mas também pessoas que possam qualificar-se e aprender em Portugal. A Alemanha tem o ensino vocacional, em Portugal a versão profissional que existe no ensino secundário tem sido desde sempre desqualificada. Ora bem, penso que as empresas e as associações empresariais podem ajudar a resolver o problema, já que conhecem por dentro as necessidades do mercado. Passámos a semana a discutir a emergência política. Acontece. Mas o tempo teria sido mais frutuoso se tivéssemos todos dado algum tipo de contributo para resolver um problema que ameaça o nosso futuro coletivo. Em 2040, dizem as previsões, faltarão 903 mil pessoas na nossa economia. Temos de evitar esta catástrofe – já.