por Armindo Monteiro, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 25.05.2024

Há, de facto, muito a acontecer na frente governativa. Muitas negociações complexas em curso onde é certamente difícil encontrar o ponto de equilíbrio entre as exigências e as expectativas das classes profissionais envolvidas e as limitações orçamentais do Governo. A obrigação de pensar não apenas no imediato e ter em conta as implicações a prazo, ou seja, os custos salariais que, daqui para a frente, passam a ser despesa pública permanente, é uma preocupação de gestão absolutamente correta e incontestável.

Este acordo com os professores deve, antes de mais, ser destacado pelo elevado grau de dificuldade que gerou e pela conflitualidade que provocava há demasiado tempo. As consequências deste longo conflito deixaram marcas na preparação dos alunos, o que significa que, agora, o importante seria recuperar o tempo perdido. Deveria ser essa a principal preocupação de todos os intervenientes, professores e ministério. Pergunto-me, no entanto, se será possível concretizar este passo, que deveria ser a sequência lógica depois do acordo. Infelizmente, não será fácil. Quatro sindicatos não assinaram o acordo, embora outros sete o tenham feito, o que significa que a tensão ameaça continuar a sobrepor-se à educação.

Tenho muita dificuldade em compreender a resistência dos quatro sindicatos que optaram por ficar de fora – as reivindicações que não foram atendidas não são centrais, são pontos laterais, o que é reconhecido por todos os observadores independentes. E, no entanto, foi o bastante para impedir uma saída limpa, como se dizia no tempo da troika.

Ora bem, este posicionamento de alguns sindicatos confirma, infelizmente, a atitude de antagonismo permanente que marca – e de certa forma até define – quase todas as negociações. Para se ter uma ideia da relutância sindical firmemente ancorada em Portugal, no nosso país, ao contrário do que acontece pela Europa fora, nunca houve qualquer acordo bilateral entre os representantes dos empregadores e os representantes dos trabalhadores. Nunca. Nem uma única vez. Isto diz muito sobre a disponibilidade dos atores institucionais portugueses, em particular de alguns sindicatos, em definir metas e em construir compromissos com as contrapartes. Há uma terrível falta de confiança na sociedade portuguesa. Competimos, não cooperamos, o que gera custos enormes para o desenvolvimento do país.

Nos últimos dois meses foram convocadas 62 greves. Não parece um pouco demais? As greves são instrumentos de defesa e de expressão muito importantes em qualquer democracia. Isso não está em causa e jamais poderá estar. No entanto, o recurso constante – e tantas vezes prematuro – a este instrumento de luta não só banaliza a sua importância como exacerba a conflitualidade social. Num contexto assim, todas e quaisquer negociações tornam-se ainda mais espinhosas e incertas.

No momento que atravessamos penso que devemos – todos – fazer um esforço para encontrar caminhos comuns. Iniciar negociações anunciando profundas linhas vermelhas é um péssimo ponto de partida. Todos os parceiros sociais têm ideias e princípios bem definidos, isso não está em causa. Mas essa necessária clareza de objetivos tem de ser conciliada com espírito construtivo. Viver é também tentar compreender os outros, como aqui já escrevi, mas temos a responsabilidade nacional de não cavar trincheiras e de pôr o interesse nacional acima de todos os outros, por mais legítimos que sejam.