por Armindo Monteiro, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 14.03.2025

Pela terceira vez em três anos e meio, lá vamos nós novamente para eleições legislativas antecipadas uma irresistível tentação política que lembra a tumultuosa I República. Apesar dos apelos de vários setores da sociedade civil, incluindo da CIP, os partidos com assento parlamentar não chegaram a um entendimento e deixaram, levianamente, o país resvalar para mais uma crise política sem grande substância, coerência, propósito ou oportunidade.

A votação da moção de confiança ao Governo oscilou entre o drama shakespeariano ambição, paixão, vingança, traição, destino — e uma RGA (Reunião Geral de Alunos) – piadolas, zombaria e muita irresponsabilidade. Enfim, o que sobrou em taticismo político-partidário faltou em sentido de Estado e zelo pelo interesse do país.

Obviamente que queremos que haja em Portugal debate público, escrutínio democrático, confronto de ideias, luta política. Esse é o sal da democracia. Mas convém que a dialética entre partidos seja elevada, responsável e construtiva, de forma a evitar crises políticas imprudentes e o inerente sacrifício do interesse nacional. e que, enquanto o país se entretém em jogos florentinos, o mundo pula e avança a uma velocidade vertiginosa, desenhando uma realidade geopolítica nova, incerta, volátil para a qual nos devíamos estar a preparar enquanto nação. Na verdade, o contexto internacional dificilmente poderia ser menos indicado para uma crise política. Estão hoje a ser discutidas questões da maior importância para o futuro da Europa, do comércio livre e da própria democracia liberal. Convinha por isso que Portugal tivesse, não só um governo estável, mas uma plataforma de entendimento e concertação entre os principais partidos. É fundamental que o país assuma uma posição política forte e convergente sobre matérias tão relevantes como a defesa e segurança da Europa, a refundação do projeto comunitário, a resposta às tarifas dos EUA, o crescimento, produtividade e competitividade da economia europeia ou as novas parcerias económicas e geopolíticas da UE. Ao invés, assistimos na cena política portuguesa a um extremar de posições e um quebrar da confiança entre as principais forças partidárias. Acresce que o impasse em que o país caiu, com a convocação de novas eleições, é forçosamente penalizador para a dinâmica económica do país. Haverá decisões congeladas, investimentos adiados e negócios suspensos por agentes económicos ansiosos ou apenas prudentes. E assim se trava, por tempo indeterminado, o desenvolvimento económico do país. Não é que esteja tudo bem nesta matéria, mas Portugal fez um verdadeiro trabalho de Sísifo para reerguer a sua economia depois de várias crises e não pode, agora, dar-se ao luxo de deitar pedras no seu próprio caminho.

Embora com níveis de crescimento aquém dos desejáveis, o nosso PIB sobe, ainda assim, acima da média europeia, ao mesmo tempo que o mercado de emprego se mantém dinâmico, a dívida pública continua o seu trajeto descendente e o excedente orçamental permanece estável.

Corremos o sério risco de as eleições antecipadas não serem politicamente clarificadoras, tomando-se impossível encontrar uma solução de governo estável e duradoura. Se a fragmentação parlamentar se acentuar, Portugal pode ficar de facto ingovernável e ver o regime degradar-se inexoravelmente sob a mirado populismo.