por Armindo Monteiro, Presidente da CIP
Publicado no Dinheiro Vivo a 04.11.2023

O Orçamento do Estado entra agora na fase decisiva: a discussão na especialidade. Uma parte significativa dos portugueses já desligou do assunto. Depois da agitação parlamentar inicial veremos até que ponto o Governo olha para a maioria absoluta que o sustenta como uma licença para ignorar as propostas dos outros partidos e entidades ou se, pelo contrário, faz um esforço para corrigir algumas trajetórias definidas na proposta de OE2024 que apresentou em outubro.

É muito importante notar que, em apenas cinco meses, sem que tenhamos assistido a nenhuma alteração estrutural digna de nota, nem a qualquer acontecimento imprevisível e marcante – o ataque terrorista contra Israel foi posterior aos números apresentados pelo Banco de Portugal -, as previsões económicas para os próximos meses e para o próximo ano pioraram. O crescimento previsto para este ano recuou. Os economistas procuram agora entender se vamos ou não entrar em recessão neste último trimestre, visto que o PIB recuou 0,2 por cento (em cadeia) no anterior. As consequências são evidentes: o lastro negativo vai prolongar-se para o próximo ano, o que pode até impactar negativamente no já anémico crescimento previsto (1,5 por cento).

Perante este cenário, a discussão que se avizinha no Parlamento não é apenas importante – será determinante para o nosso futuro imediato. Em tempo útil, apresentámos as nossas propostas e negociámos até onde julgámos possível. Não chegámos a acordo com o Governo, mas o nosso compromisso de diálogo permanente mantém-se inalterado. Neste sentido, enviámos uma carta aos grupos parlamentares com o objetivo assumido de procurar que algumas dessas ideias possam ainda ganhar corpo e serem aprovadas na votação final global.

A economia está em dificuldades. A taxa de desemprego aumentou ligeiramente em setembro. A probabilidade de aumentar mais não é despicienda. Entre os empresários, o que sobressai é a enorme preocupação com este progressivo degradar das condições económicas. Naturalmente, os investimentos já estão a ser reavaliados – qual o sentido de investir perante o aumento constante da incerteza? Haverá alguma razão para comprar novas máquinas ou contratar mais pessoas se a procura interna está vulnerável e as exportações caem? As empresas pagam impostos e contribuições todos os meses – não temos ciclos eleitorais, temos, sim, o dever de atingir resultados capazes de pagar todos os nossos compromissos com as pessoas, as outras empresas e o país.

O Orçamento do Estado do próximo ano pode ser um tónico capaz de melhorar a confiança nacional. Como se sabe, o excedente orçamental até setembro atingiu os sete mil milhões de euros, o que deveria ter alguma expressão na política económica do Executivo. Para o ano também está previsto novo excedente, embora menor. A pergunta que devemos colocar é bem simples: o que deve o Estado fazer nesta situação – deixar a economia soçobrar ou dar-lhe o respaldo necessário para ultrapassar as dificuldades? A resposta será dada pelo resultado das discussões do OE2024 na especialidade. Penso que Portugal deve fazer tudo para evitar um novo ciclo de empobrecimento. A escolha é política e a política é a arte do compromisso.