Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 11.03.2017

“Num ambiente em que os cidadãos encaram o futuro com um misto de desilusão e de medo, a Europa enfrenta múltiplos desafios, em diversas frentes.

Aos problemas económicos, que se refletem num fraco crescimento, perda de competitividade, escassez de investimento e altos níveis de desemprego, somam-se as questões de segurança, a crise migratória, o aumento do euroceticismo e do populismo.

A dificuldade em vencer estes desafios é agravada por um ambiente externo adverso, marcado por desequilíbrios e conflitos, pelo terrorismo, pelo abrandamento do crescimento global, e pelo ressurgimento de tendências protecionistas, perigosamente alimentadas pela nova administração norte-americana.

Pela sua dimensão e poder económico, pela posição que ocupa no contexto mundial, a União Europeia tem não só a capacidade, mas também a obrigação de, coesa, responder a estes desafios.

A resposta tem falhado. Ao nível nacional, é nítida a perda de fôlego reformista na maior parte dos seus membros. Ao nível supranacional, o projeto europeu parece refém dos ciclos eleitorais e de interesses nacionais dificilmente conciliáveis.

A Comissão Europeia abdicou de um papel de liderança – papel que exerceu tantas vezes, no passado, com a apresentação de propostas ambiciosas – refugiando-se no seu estatuto de “guardiã dos Tratados”.

Em novembro, num documento tecnicamente bem fundamentado, reconheceu que é necessária “uma abordagem coletiva para ultrapassar um cenário em que todos perdem”. E constatou que as regras do atual modelo de governação económica não permitem ir mais longe nessa abordagem coletiva, sem, contudo, apresentar propostas de mudança.

Há dias, no seu Livro Branco para o Futuro da Europa, receosa de provocar mais clivagens ou de “queimar” soluções, a Comissão limitou-se a apresentar aos Estados-membros cinco cenários, para reflexão.

Os líderes dos quatro maiores países europeus foram rápidos na sua opção pelo cenário da Europa a várias velocidades, mesmo que sem ideias muito claras sobre o seu conteúdo.

Outros, mais a leste, rejeitaram-no e apelaram a um papel mais “significativo e definitivo” dos parlamentos nacionais no processo de tomada de decisão.

Também neste tema, reitero um conceito que me é muito caro: “sozinhos podemos ir mais rápido, mas juntos iremos sempre mais longe”. Contudo, é preciso saber para onde queremos ir e quem está disposto a iniciar o caminho.

Se a Comissão passa a responsabilidade para os Estados-membros, numa altura em que a proximidade de eleições em alguns países torna difícil a tomada de decisões, julgo que será o momento para que os Governos com maior margem de manobra tomem desde já posição sobre que reformas e que prioridades devem constar de uma agenda europeia para o crescimento.

Em Portugal, precisamos de antecipar a nossa resposta a eventuais cenários, mas precisamos sobretudo de participar ativamente na construção de um futuro para a Europa.

Mais que debater cenários, é preciso discutir propostas de mudança.”