Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 23.09.2017

“As dificuldades no financiamento das empresas continuam a constituir um sério constrangimento a um relançamento mais forte do investimento e à desejável mudança estrutural da economia portuguesa. A solução terá de passar necessariamente pela banca, empresas e Governo e não se afigura fácil. Continuar a adiá-la, no entanto, não é  –ou não deveria ser – alternativa.

Após longos anos de uma oferta de crédito imprudente, que levou a um nível de endividamento excessivo, tivemos, sob o Programa de Ajustamento, a exigência de um processo de desalavancagem brutal num curto prazo de tempo, ao mesmo tempo que os bancos se tiveram de adaptar a novas regras, mais exigentes.

Desde junho de 2011 até ao presente, o stock de empréstimos concedidos pelo setor financeiro português às empresas reduziu-se 32,5% – mais de 36 mil milhões de euros.

Embora a um ritmo mais moderado, este processo ainda prossegue. Só nos primeiros seis meses deste ano, o total de empréstimos às empresas já diminuiu perto de 1,8 mil milhões de euros.

Trata-se de uma evolução consistente com o processo de desalavancagem das empresas, mas que reflete, por outro lado, a manutenção das suas dificuldades no acesso ao financiamento bancário.

Esta situação é particularmente perturbadora porque uma das fragilidades estruturais do nosso tecido empresarial é a excessiva dependência de crédito bancário, sobretudo de curto prazo.

E é de resolução particularmente difícil, tendo em conta que os bancos se encontram debilitados pelos elevados rácios de crédito em incumprimento, exacerbando comportamentos de aversão ao risco e estreitando critérios de concessão de crédito.

Por outro lado, uma proporção significativa das empresas portuguesas apresenta estruturas financeiras desequilibradas, com elevados níveis de endividamento.

Esta questão assume uma importância crucial no caso das PME, sendo urgente a sua recapitalização e a substituição do crédito bancário por financiamentos/dívida de maior estabilidade.

Neste contexto, torna-se urgente a aplicação de uma estratégia global que dê resposta ao problema do crédito em incumprimento, facilitando a reestruturação da dívida das empresas economicamente viáveis.

É importante, também, que seja reforçado o papel da Instituição Financeira de Desenvolvimento como instrumento dinamizador de diversificação das fontes de financiamento e da capitalização das PME.

É crucial que seja incluída no próximo Orçamento do Estado a regularização urgente, completa e definitiva dos pagamentos em atraso por parte de todas as entidades públicas.

Finalmente, é fundamental estimular o recurso aos capitais próprios. Neste sentido, há diversas medidas previstas no Programa Capitalizar que devem constar do Orçamento do Estado para 2018. Destaco a este respeito a atribuição de um crédito fiscal aos sócios de empresas que realizem entradas em dinheiro para repor o capital social, bem como o alargamento do âmbito da aplicação do regime da remuneração convencional do capital social.

Extinta que foi a Estrutura de Missão para a Capitalização de Empresas, é preciso que as estruturas governamentais responsáveis pelas diversas vertentes do Programa Capitalizar assegurem um elevado nível de ambição na implementação no terreno de muitas das medidas que se encontram ainda em curso e das que estão ainda por iniciar.”