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setembro 2014
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Nota Crítica   Nota Crítica
A CIP, na sua crítica ao Projeto de Deliberação da Comissão Nacional de Proteção de Dados sobre geolocalização em meio laboral, referiu, em geral, o seguinte:

1.
Através do Projeto de Deliberação em referência, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (doravante CNPD) intenta estabelecer os princípios e as condições gerais aplicáveis aos tratamentos de dados pessoais decorrentes da utilização de tecnologias de geolocalização no contexto laboral. 

Mais concretamente, o Projeto de Deliberação tem por objeto disciplinar a utilização dos dispositivos de geolocalização, em contexto laboral, que se encontrem instalados em veículos automóveis e em equipamentos móveis inteligentes, entre os quais se incluem os telemóveis, computadores portáteis e tablets.

Tais dispositivos permitem a recolha de dados pessoais, que, no entender da CNPD, se enquadram no conceito de dados sensíveis, face ao disposto na alínea a) do artigo 3.º e no n.º 1 do artigo 7.º, todos da Lei n.º 67/98, de 26 de outubro, que transpõe para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva n.º 95/46/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos dados pessoais e à livre circulação desses dados – Lei da Proteção de Dados Pessoais (doravante LPD).

Por exemplo, os dispositivos de geolocalização instalados em veículos, podem registar inúmeros parâmetros, como dados relativos à sua localização, sensores de portas, sensores de movimento dentro das cabines, força das travagens, força G (nas curvas), velocidade, rotações por minuto, consumos e outros regimes do motor, bem como bloquear automaticamente o motor, caso o dispositivo GPS (Global Position Satellite) seja desligado ou em situação de furto.

Também a título meramente exemplificativo, através de telemóveis pode obter-se a localização do trabalhador e, relativamente aos computadores portáteis (embora também seja possível para certos telemóveis), o empregador pode conhecer a localização do equipamento se aí instalar um MDM (Mobile Device Management), configurado para aceder ao sensor de GPS e, mesmo, aceder a outros sensores do aparelho, como sejam a câmara e o microfone.

Neste contexto, analisa-se, no Projeto de Deliberação em apreço, as implicações para a proteção de dados e a privacidade dos trabalhadores dos dispositivos de geolocalização instalados, como se disse, nos veículos automóveis, por um lado, e nos dispositivos móveis inteligentes, por outro, no âmbito da relação laboral.

Para o efeito, a CNPD fundamenta o Projeto de Deliberação numa extensa argumentação que, para o que agora nos interessa, parte do reconhecimento de que a possibilidade de geolocalização de pessoas no contexto laboral não se encontra expressamente prevista em qualquer norma do ordenamento jurídico nacional.

Assim sendo, entendendo a CNPD, como entende, que os dispositivos de geolocalização instalados em equipamentos usados pelos trabalhadores constituem um meio de vigilância à distância, a Comissão considera que o Código do Trabalho (doravante CT) contém previsões legais relativas a este domínio - artigos 20º e seguintes -, onde se admite a utilização de equipamento tecnológico para vigilância à distância para a finalidade de “proteção e segurança de pessoas e bens” ou “quando particulares exigências inerentes à natureza da actividade o justifiquem” (cfr. n.º 2 do artigo 2.º do CT).

Ressalta-se, no entanto, quanto à abrangência do n.º 1 do artigo 20.º do CT, que a inclusão do GPS no seu âmbito, já foi objeto de análise e decisão por parte do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

De facto, a este mesmo respeito, o STJ já se pronunciou em dois Acórdãos.

No Acórdão de 13.11.2013, proferido no âmbito do processo n.º 73/12.3TTVNF.P1.S1, o STJ referiu, no seu sumário, quanto à utilização de dispositivos de GPS, o seguinte:

“1. O conceito de «meios de vigilância à distância» expresso no n.º 1 do art. 20.º do Código do Trabalho de 2009 está reportado aos equipamentos que traduzam formas de captação à distância de imagem, som ou som e imagem que permitam identificar pessoas e detetar o que fazem, como é o caso, entre outros, de câmaras de vídeo, equipamento audiovisual, microfones dissimulados ou mecanismos de escuta e registo telefónico.

2. O dispositivo de GPS instalado, pelo empregador, em veículo automóvel utilizado pelo seu trabalhador no exercício das respetivas funções, não pode ser qualificado como meio de vigilância à distância no local de trabalho, nos termos definidos no referido preceito legal, porquanto apenas permite a localização do veículo em tempo real, referenciando-o em determinado espaço geográfico, não permitindo saber o que faz o respetivo condutor.

3. O poder de direção do empregador, enquanto realidade naturalmente inerente à prestação de trabalho e à liberdade de empresa, inclui os poderes de vigilância e controle, os quais, têm, no entanto, de se conciliar com os princípios de cariz garantístico que visam salvaguardar a individualidade dos trabalhadores e conformar o sentido da ordenação jurídica das relações de trabalho em função dos valores jurídico-constitucionais.

4. Encontrando-se o GPS instalado numa viatura exclusivamente afeta às necessidades do serviço, não permitindo a captação ou registo de imagem ou som, o seu uso não ofende os direitos de personalidade do trabalhador, nomeadamente a reserva da intimidade da sua vida privada e familiar.”  (sublinhado nosso).

No mesmo sentido, o Acórdão do STJ de 22.05.2007, no âmbito do processo n.º 07S054, refere o seguinte:

“2. Não se pode qualificar o dispositivo de GPS instalado no veículo automóvel atribuído a um técnico de vendas como meio de vigilância a distância no local de trabalho, já que esse sistema não permite captar as circunstâncias, a duração e os resultados das visitas efetuadas aos seus clientes, nem identificar os respetivos intervenientes.

3. Assim, deve concluir-se que carece de justa causa a resolução do contrato de trabalho efetivada por aquele trabalhador com fundamento em alegada violação do disposto no artigo 20.º do Código do Trabalho.” (sublinhado nosso).

Face ao exposto, é perspetiva da CIP que o entendimento fixado pelo Supremo Tribunal de Justiça sobre o GPS, pela sua ponderação e respeito pelos elementares princípios da relação laboral, e, em especial, o princípio da proporcionalidade, é o que melhor se adequa à questão em apreço.

2.
Como parâmetro nuclear, acresce a seguinte questão: pode a CNPD delimitar e remeter a um âmbito tão restrito, a pretexto da sua interpretação e aplicação – tarefas naturalmente cometidas às instâncias judiciais - uma norma legal, emitindo uma apreciação condicionante e vinculante e submetendo-a ao seu controlo contraordenacional?

3.
Sem prejuízo e deixando sempre bem vincado quanto anteriormente ficou expresso, especiais preocupações da CIP neste domínio – utilização de dispositivos de geolocalização em meio laboral –, colocam-se, precisamente, num quadro onde avultam finalidades previstas no citado n.º 2 do artigo 20º do CT, ou seja, quando o recurso a tais dispositivos tenha por objetivo a proteção e segurança de pessoas e bens ou quando particulares exigências inerentes à natureza da atividade o justifiquem.

Encontram-se, neste caso, em primeiríssimo lugar, a segurança das pessoas (dos próprios colaboradores da empresas ou de terceiros que se relacionem ou não com a empresa), seguindo-se a proteção de bens – mormente bens perecíveis (p. ex.: pão), de valor elevado (p. ex.: ouro) ou perigosos (substancias químicas ou explosivos) – aquando do seu transporte ou durante o seu manuseamento em fábrica, a reserva de confidencialidade de informação, a otimização da gestão dos recursos e a recuperação de bens e informação em situações de acidente, furto, roubo ou perda de veículos ou equipamentos.

A evolução tecnológica dos últimos anos tem permitido às organizações assumirem um papel cada vez mais proactivo, nomeadamente nas questões que dizem respeito à segurança dos seus colaboradores e no domínio da responsabilidade social das empresas, pelo que, não raro, na ponderação entre o nível de proteção dos dados pessoais destes últimos e a latitude do poder de direção do empregador, também terão que ser valoradas componentes respeitantes à segurança dos próprios trabalhadores (pense-se, por exemplo, num rapto) ou da sociedade em geral (p. ex.: a monitorização que indiciem atividades ilícitas ou criminais relacionadas com o tráfego de drogas, desastres ambientais ou atividades terroristas).

Certo que o recurso a tais dispositivos se deve fundar em critérios de proporcionalidade, necessidade e adequação, como tal previstos, entre outros, no n.º 2 do artigo 21º do CT, tendo em conta, por um lado, os direitos à proteção de dados pessoais e à privacidade na vida pessoal e familiar do trabalhador e, por outro lado, o princípio da liberdade de gestão.

4.
Cumpre verificar, ainda, que, em geral, a utilização abusiva ou ilícita de dados pessoais, por exemplo, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 20º do CT, obtida através por meio de dispositivos de geolocalização já se encontra legalmente proibida e punida (v. artigos 20º e 21º do CT), não sendo os dados obtidos com essa violação reconhecidos ou, sequer, aceites em sede judicial.

5.
Em síntese, na perspetiva da CIP, o Projeto de Deliberação merece fortes reparos críticos.

 

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