Esta é a oportunidade para a União Europeia mostrar que é, de facto, um projeto mobilizador, capaz de acrescentar uma mais-valia aos esforços desenvolvidos por cada Estado-membro.

Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 28.03.2020

https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/duas-notas-em-tempo-de-emergencia/

Deixo hoje mais duas breves notas que me parecem da maior importância para o combate que todos travamos, nestes dias.

Afirmei já que os 9200 milhões de liquidez a injetar na economia, anunciados pelo Governo português, comparam mal, em termos relativos, com o que outros países europeus se propõem fazer chegar às suas empresas. No entanto, não são os montantes anunciados que mais me preocupam. Esses podem ser aumentados, e sê-lo-ão, certamente, por força das circunstâncias.

O que mais me preocupa são as disfunções que ainda permanecem nos vários instrumentos que estão a ser delineados e prejudicam a eficácia e rapidez com que as medidas estão a chegar ao terreno. Os apoios têm vindo ser ajustados, na sua configuração, mas ainda não se compadecem com a urgência que a gravidade da situação requer. É tempo de abandonar burocracias e exigência descabidas.

Ouvia, um destes dias, na rádio, um empresário dizer: “Não despedi, nem quero despedir. Mas não sei como vou pagar salários”. Esta frase resume bem a angústia por que estão a passar milhares e milhares de pequenos e médios empresários. Resume bem, igualmente, o sentido de urgência que deve haver na forma como se desenham os instrumentos de apoio para que estas empresas possam aguentar as próximas semanas, os próximos meses, sem terem de desistir e encerrar portas definitivamente, deixando no desemprego os seus trabalhadores.

No plano europeu, depois das primeiras declarações bem-intencionadas, preocupa-me agora a inércia na tomada de decisões.

O Banco Central Europeu, depois de uma “falsa partida”, respondeu com eficácia. Prova-o o facto das taxas de juro, no caso português, não terem ido muito além de 1%, nos mercados financeiros internacionais.

A Comissão Europeia depressa suspendeu as regras de disciplina orçamental e flexibilizou as que impõe às ajudas de Estado.

Pouco mais vimos.

Fica a ideia de que, num momento de emergência, o melhor de que a União Europeia é capaz é não “estorvar” os Estados-membros.

Ora, esta é a oportunidade para a União Europeia mostrar que é, de facto, um projeto mobilizador, capaz de acrescentar uma mais-valia aos esforços desenvolvidos por cada Estado-membro, coordenar a sua ação, protegê-los das suas vulnerabilidades.

Não será com um orçamento de pouco mais de 1% do PIB que a União Europeia poderá acorrer às necessidades dos Estados-membros. São precisos novos instrumentos. Os eurobonds – agora sob o nome de coronabonds – são precisamente um instrumento indicado para mostrar que uma Europa unida e solidária vale mais do que a soma dos seus membros. Têm de ser urgentemente postos na agenda europeia, vencendo preconceitos e tabus.

Um jornal internacional de referência titulava que o “coronavírus revela o melhor e o pior dos líderes mundiais”. Dispensamos o pior. Precisamos do melhor.