Não deveremos sujeitarmo-nos a tetos de consumo que sejam obstáculos ao crescimento económico. Em contrapartida, teremos de fazer prova de que não poupamos esforços e recursos no âmbito da real eficiência energética.

Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 24.06.2017

“As propostas da Comissão Europeia inseridas no “Pacote Energia Limpa” colocam a Portugal novos desafios que poderão ter claras implicações no seu crescimento económico.

Tínhamos a perspetiva de um conjunto de objetivos na área da energia, onde avultava a meta indicativa de 27% de redução do consumo de energia primária, a atingir em 2030.

Este era um objetivo exigente, mas razoavelmente compatível com as metas nacionais de 25%, entretanto fixadas pelo Governo, para o mesmo prazo.

Nas novas propostas da Comissão Europeia, o objetivo passa a 30%, se possível, vinculativo.

Esta linha não serve claramente o interesse de Portugal, uma vez que, ao instituir um teto ao consumo de energia persiste na colagem do conceito de eficiência energética ao da redução pura e simples do consumo energético, em termos absolutos.
Portugal necessita de crescimento económico e de consumir energia com maior eficiência, não de “produzir menos” e, portanto, consumir menos.

Estas propostas constituem, assim, um sinal errado, que penaliza especialmente as economias onde o esforço de convergência económica terá de ser mais exigente.

Portugal atingiu em 2005 o seu consumo máximo de superior a 27 milhões de toneladas equivalentes de petróleo.

Dez anos depois, esse consumo, expresso nas mesmas unidades, desceu para cerca de 22 milhões, ou seja, menos 18,5%.

No setor dos transportes, a redução de consumos nesse período, foi, em percentagem, da mesma ordem de grandeza.

Porém, no conjunto das indústrias extrativas e transformadoras, a redução nesse período, foi maior, situando-se nos 20%.

Este último resultado beneficiou do sucesso de medidas de eficiência energética?
Certamente que sim.

Mas foi também a consequência de uma menor atividade económica, nomeadamente em diversos setores industriais.

Os efeitos da crise não poderão ser permanentes e o País tem o legítimo direito de aspirar e de trabalhar para aceder a níveis de atividade económica mais elevados, mesmo que daí advenham por essa via acréscimos nos consumos energéticos.

Tenho defendido que só através de taxas de crescimento na ordem dos 3% poderemos superar os atuais desequilíbrios e problemas da nossa economia, nomeadamente o desemprego (ainda em valores socialmente inaceitáveis) e os elevados níveis de endividamento, público e privado. Desequilíbrios e problemas cuja correção tem sido objeto de insistência, precisamente por parte da Comissão Europeia.

Acresce que o crescimento económico terá necessariamente por base a generalidade dos setores produtores de bens e serviços transacionáveis, onde encontramos indústrias com elevada intensidade energética.

Não deveremos, portanto, sujeitarmo-nos a tetos de consumo que sejam obstáculos ao crescimento económico. Em contrapartida, teremos de fazer prova de que não poupamos esforços e recursos no âmbito da real eficiência energética.

Gastar melhor terá de ser o nosso objetivo.

Se daí resultar menor consumo, melhor ainda, mas sem prejuízo de objetivos mais amplos de crescimento económico.”