As recomendações específicas para Portugal, que deverão ser adotadas dentro de dias pelo Conselho da União Europeia, incluem, novamente, a “aplicação de uma estratégia global que dê resposta ao problema do crédito em incumprimento”. Contudo, a solução tarda e o problema mantém-se.

Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 17.06.2017

“Há muito que se fala, em Portugal, da necessidade de encontrar uma solução para o problema do crédito malparado.

As últimas análises à economia portuguesa de instituições internacionais, seja da OCDE, do FMI ou da Comissão Europeia, apontam este problema como fonte de vulnerabilidades para o setor bancário e como constrangimento ao financiamento do investimento.

As recomendações específicas para Portugal, que deverão ser adotadas dentro de dias pelo Conselho da União Europeia, incluem, novamente, a “aplicação de uma estratégia global que dê resposta ao problema do crédito em incumprimento”.

Contudo, a solução tarda e o problema mantém-se, embora os últimos dados deem conta de uma ligeira redução dos rácios de créditos vencidos, desde outubro do ano passado.

Lamentavelmente, este problema tem vindo a ser encarado quase exclusivamente do ponto de vista do seu impacto na banca.

Ora, este não é apenas um problema da banca, mas também das empresas, sobretudo das PME. 28% das microempresas que são devedoras à banca têm créditos em incumprimento. No caso das pequenas empresas este rácio é de um pouco mais de 24% e, nas médias empresas, de quase 23%.

Como venho alertando repetidamente, uma solução que tenha apenas por objetivo a limpeza dos balanços dos bancos correria o risco de provocar uma onda de encerramentos de muitas empresas economicamente viáveis, com pesadas consequências ao nível do emprego, do crescimento e da destruição de ativos produtivos.

Recentemente, o Primeiro-Ministro deu conta, no Parlamento, da apresentação de uma proposta de solução aos três principais bancos do país com mais elevado nível de crédito malparado, com o pedido de um parecer.

De acordo com a imprensa, a solução passará pela centralização da gestão de créditos transversais a mais do que um banco numa só estrutura, com os objetivos de acelerar os processos de reestruturação, aumentar o poder negocial face a potenciais compradores e reduzir custos.

A confirmar-se tal intenção, resta saber o que é que tal gestão centralizada significará para as empresas economicamente viáveis e com dívidas à banca em atraso.

Será esta solução movida unicamente pelo objetivo de vender créditos ao melhor preço, ou permitirá a constituição de carteiras de créditos de empresas economicamente viáveis e reestruturá-las financeira e operacionalmente, de modo a proteger o seu contributo para a produção e o emprego? Quem irá gerir essas carteiras?

Mais uma vez, insisto: o problema não é só da banca, é também, principalmente, das PME, pelo que seria bom que, na procura de uma solução, não fossem envolvidos apenas os bancos, mas também os representantes da comunidade empresarial.”