Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao domingo.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 16.12.2018

https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/contestacao-em-franca/

A eclosão do movimento dos “coletes amarelos” dá razões de sobra para refletir… e mudar. Não só em França.

Hoje em dia, é cada vez mais fácil, através das redes sociais, desencadear movimentos populares de contestação, mas, como os fogos, estes não se propagam se não encontrarem terreno propício. Em França, as elevadíssimas taxas de simpatia popular para com este movimento são a demonstração clara que os “coletes amarelos” encontraram, na sociedade francesa, terreno favorável aos seus protestos.

Evidentemente, não há justificações para as cenas de violência e vandalismo a que assistimos. Mas não podemos simplesmente rejeitar os efeitos sem compreender as causas.

E as causas são, fundamentalmente, o sentimento de clivagem entre as elites políticas e uma parte significativa da população, a deceção face a promessas eleitorais de uma nova forma de fazer política e, na base de tudo isto e como principal detonador da indignação, o eterno recurso a mais impostos como forma de alimentar um Estado que não cumpre.

O Presidente Macron, primeiro timidamente, esta semana de forma mais clara, reconheceu a dimensão desta indignação e compreendeu que não tinha alternativa que não fosse ir ao encontro das reivindicações do movimento.

As principais medidas agora anunciadas, depois de auscultados os parceiros sociais, foram:

  • O aumento em 100 euros por mês, a partir de 2019, do salário mínimo, “sem o custo de mais um euro para o empregador”, através do aumento de uma prestação social (a “prime d’activité”);
  • A isenção total de impostos e contribuições sociais da remuneração das horas extraordinárias;
  • O cancelamento do aumento da Contribuição Social Generalizada para pensionistas que recebem menos de 2 000 euros por mês.

Macron pediu ainda a “todos os empregadores que o possam fazer para atribuir um prémio extraordinário de final de ano aos seus trabalhadores”. Para os estimular a fazê-lo, especificou que este prémio extraordinário estará isento de impostos e contribuições sociais.

Tenho de reconhecer, no mínimo, o mérito em resistir à tentação fácil e essa sim, populista, de pretender que sejam as empresas a suportar o custo dessas medidas.

Se conseguir suster a contestação nas ruas, o Presidente Macron terá conquistado margem de manobra para responder a esta crise social com o mais difícil: aproximar as instituições dos cidadãos, reformar o Estado e redesenhar o modelo social do país.

Nas palavras do MEDEF, confederação dos empregadores franceses, este novo contrato com a Nação deve também ser uma oportunidade para permitir que as empresas criem riqueza e emprego em melhores condições.

De facto, as expectativas de maior bem-estar material e de maior equidade só podem ser correspondidas com mais e melhor crescimento económico, que só as empresas podem proporcionar. E o pior que os políticos, franceses ou de qualquer outro país, podem fazer é prometer o impossível.