A CIP remeteu à Assembleia da República, a sua Nota Crítica ao Projeto de Lei n.º 533/XIII/2.ª, que prevê a eliminação dos regimes do banco de horas individual e da adaptabilidade individual, procedendo à 12.ª alteração ao Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 7 de fevereiro, da autoria do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A CIP, na supramencionada Nota Crítica, referiu, em síntese, o seguinte:

1.

O Projeto de Lei em referência visa proceder à 12.ª alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

O Código do Trabalho, desde a sua aprovação, em 2009, já sofreu 11 alterações ao seu regime.

Verifica-se, assim, que o referido Código foi objeto de mais de 1 alteração por ano.

A CIP, não obstante entender que os regimes jurídicos devem acompanhar a evolução das múltiplas dimensões da sociedade, considera que mudança constante dos regimes não confere

ou permite a devida estabilidade dos “sistemas”, circunstância que condiciona o efeito útil dos

mesmos.

2.

O Projeto de Lei em referência visa, tão só e apenas, proceder à supressão de alguns dos (senão mesmo os) mais relevantes instrumentos de organização do tempo de trabalho, a saber, o banco de horas individual e a adaptabilidade individual, revogando, para o efeito, os artigos 205º e 208º-A do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação em vigor (doravante CT) – cfr. artigos 1º e 2º do PL em apreço.

De acordo com o que se expressa na “Exposição de Motivos” do PL em análise, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (doravante BE) alega um extensíssimo arrazoado de comentários, todos no sentido de apontar para os graves malefícios de tais formas de organização do tempo de trabalho, que apelida de “mecanismos” ou “modelos” de “desregulação do tempo de trabalho”.

Destaca-se, desde logo, a seguinte afirmação: “Tendo origem num projeto do governo do PSD e do CDS-PP, a Lei n.º 23/2012, de 25 de junho que surgiu na sequência do Memorando sobre as Condicionalidades de Política Económica, tinha uma pretensão clara de diminuir o custo do trabalho, por via da eliminação de feriados, eliminação do descanso compensatório pela prestação trabalho suplementar, eliminação de dias de férias, redução das compensações pela cessação do contrato de trabalho e introdução de uma nova modalidade do despedimento por inadaptação sem modificação do posto de trabalho. Uma das matérias em relação à qual esta lei assumiu especial enfoque foi a da desregulação do tempo de trabalho.”.

Uma tal afirmação não tem aderência real.

O Projeto de Lei mostra um total desprezo pela competitividade recentemente introduzida na economia portuguesa, mormente através da legislação laboral.

Estamos todos conscientes de que os atuais níveis de bem-estar económico da grande maioria dos portugueses são ainda insatisfatórios.

Reconhecemos todos que o bem-estar económico dos portugueses depende do seu rendimento.

Todavia, o rendimento só poderá aumentar de forma sustentável se forem criadas as condições necessárias para as empresas produzirem mais.

É por isso necessário recentrar o debate sobre a economia nos seus protagonistas, em quem gera valor económico, em quem cria emprego: as empresas.

O principal critério objetivo de avaliação da política económica deverá ser sempre baseado nos efeitos positivos ou negativos que tais políticas venham a provocar na competitividade das empresas.

Ora, o Projeto de Lei em análise vai claramente no sentido contrário ao desejado, prejudicando a competitividade das empresas portuguesas e a sua capacidade de produzirem mais e distribuírem mais rendimento.

Mais ainda:

O que se verificou foi que, após um difícil período marcado pela crise económica e financeira que a todos nos afetou e ainda afeta, é com agrado que verificamos a melhoria de alguns indicadores relevantes:

– Uma redução significativa da taxa de desemprego – de um máximo de 17.5% no primeiro trimestre de 2013, descemos para 10.1% no primeiro trimestre deste ano; de acordo com os últimos dados mensais, estaremos já abaixo dos 10%.

– O PIB cresceu 1.4%, em 2016, refletindo o desempenho da atividade acima do esperado na segunda metade do ano, após um início de ano que dececionou, pelo menor dinamismo. No primeiro trimestre deste ano, o PIB continuou a acelerar, aumentando 2.8% – a taxa de crescimento homóloga mais elevada desde o quarto trimestre de 2007.

– Esta aceleração da atividade económica resultou do bom desempenho das exportações e do investimento, que acentuaram o seu crescimento. Além disso, o aumento das exportações terá excedido o das importações. Este perfil é, assim, compatível com uma trajetória sustentável da economia.

– As exportações de bens e serviços tiveram um aumento acumulado de mais de 30%, a preços constantes, nos últimos cinco anos.

– O défice público, em 2016, fixou-se em 2%, assegurando a saída de Portugal do procedimento por défice excessivo; em 2010, o défice tinha sido de 11.2%.

– O índice de confiança dos consumidores atingiu nos últimos dois meses um máximo desde o início da respetiva série do INE (1997).

Estes sim, são sinais claros que reforçam a nossa confiança no futuro.

Mas o ponto de viragem tem um momento marcante, que o BE quer, de toda a forma e feitio, mascarar.

O que se verificou, pois, não foi a “pretensão clara de diminuir o custo do trabalho” – como quer fazer crer o BE – mas, isso sim, a introdução de maior competitividade na economia portuguesa, através das empresas e dos seus trabalhadores.

Cremos, aliás, que até o BE reconhece que sem empresas não há emprego nem rendimentos que a este estão associados.

Voltar ao quadro anterior à possibilidade de criação deste instrumento por acordo, é, na perspetiva da CIP, não só retirar a um universo muito grande de empresas este instrumento do maior relevo na flexibilidade que a competitividade impõe, como contribuir negativamente para a dinamização que se diz querer imprimir à contratação coletiva.

Perante este enquadramento, a CIP formula um juízo globalmente muito negativo, mesmo de frontal rejeição, de toda o PL em apreço, através da qual se intenta subtrair à economia portuguesa dos mais relevantes instrumentos de competitividade que lhe têm permitido ombrear com os seus mais diretos concorrentes num Mundo em constante mutação e competição.

3.

A discordância e frontal rejeição incide, também, na metodologia.

Através do Projeto em análise, o BE (à semelhança do que tem sucedido com outros Grupos Parlamentares de esquerda), volta a demonstrar um frontal desrespeito pela autonomia do Diálogo Social Tripartido, bem como pelos seus principais atores: os Parceiros Sociais.

Isto porque a redação dos dispositivos que regulam, no CT, a organização do tempo de trabalho, emerge de dois Acordos alcançados em sede de Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), a saber:

– O “Acordo Tripartido para um Novo Sistema de Regulação das Relações Laborais, das Políticas de Emprego e da Protecção Social em Portugal”, de 25 de junho de 2008, que traçou as linhas gerais para a revisão do Código de Trabalho de 2009, aprovada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro; e

– O “Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego”, celebrado entre o Governo e a maioria dos Parceiros Sociais com assento na Comissão Permanente de Concertação Social, em 18 de janeiro de 2012.

A matéria assume relevo do maior impacto e alcance no desenvolvimento das relações laborais, sendo inaceitável o afastamento destes assuntos dos seus principais atores, como se disse, os Parceiros Sociais, intentando-se destruir, sem qualquer justificação plausível, o que, em negociação, foi definido pelos Parceiros Sociais em Concertação Social.

E isto quando se reconhece que a consensualização de soluções em sede de Concertação Social, sobretudo em matérias relativas à legislação laboral, contribui decisivamente para o estabelecimento de um clima de paz e de coesão social, que é tido como condição fundamental ao desenvolvimento harmonioso do País.

4.

Regista-se, igualmente, que o PL prevê profundas alterações legislativas ao Código do Trabalho, as quais terão um profundo impacto na vida das empresas, ao nível da gestão, ao nível burocrático e, ainda, ao nível financeiro.

Neste contexto, questiona-se o seguinte: Como se explica que, através do PL apresentado, se esteja a pretender alterar o Código do Trabalho, quando o “Compromisso Tripartido para um Acordo de Concertação Social de Médio Prazo”, celebrado em sede de CPCS, em 17 de janeiro de 2017, entre o Governo e a maioria dos Parceiros Sociais, prevê a discussão durante 2017, na sequência do Livro Verde das Relações Laborais, de uma avaliação integrada e partilhada do quadro laboral, com vista à obtenção de um Acordo nessa sede ?

Perante todo este enquadramento, a CIP, reitera-se, formula um juízo globalmente muito negativo – de rejeição, mesmo – sobre o Projeto de Lei em apreço.