Planeamento de Infraestruturas
CIP alerta Governo para a necessidade de não repetir erros do passado

O Programa Nacional de Investimentos 2030, lançado pelo Governo em junho, constitui provavelmente a última oportunidade do país para suprir as enormes fragilidades competitivas da ferrovia nacional. Recorde-se que, em relação a Portugal, Espanha “só” tem 30 anos de avanço na construção de rede ferroviária de bitola europeia, com o primeiro troço a ser construído em 1988. Portugal ainda não começou. A possibilidade do país se tornar numa “ilha ferroviária”, com os enormes custos associados ao nível da competitividade das empresas portuguesas e do emprego, não podem continuar a ser descurados pelos sucessivos Governos. É urgente seriedade por parte dos decisores políticos no tratamento de uma questão estrutural para o país. “A decisão que for tomada no âmbito do Programa Nacional de Investimentos 2030 irá condicionar a competitividade da economia portuguesa, o emprego e a criação de riqueza, possivelmente em três décadas, ou mais. Trata-se de um investimento estruturante para o país e para as gerações futuras”, alerta Luís Mira Amaral, Presidente do Conselho da Indústria da CIP.

Os planos inscritos no Ferrovia 2020, bem como o recente anúncio do lançamento de concurso para a modernização da Linha da Beira Alta, entre Cerdeira e Guarda, com um valor de 11 milhões de euros, constituem um sinal alarmante do autismo do Governo em relação às necessidades futuras do país. Refira-se que os atuais estudos de tráfego subestimam em larga escala a procura total de transporte ferroviário de mercadorias nas próximas décadas, nomeadamente no Corredor Ferroviário Norte – responsável por mais de 60% das nossas exportações. Não só porque não têm em devida linha de conta a perda de competitividade estimada para a rodovia, por motivos ambientais e energéticos, mas também porque simplesmente ignoram os objetivos fixados, em 2011, pela União Europeia, de ter mais de 50% do tráfego de mercadorias em distâncias superiores a 300 Km transferido da rodovia para os modos marítimo e ferroviário até 2050.

A Espanha investe milhares de milhões de euros do Orçamento de Estado todos os anos na rede ferroviária de bitola europeia, bem como avultados Fundos da UE e planeia manter o ritmo de investimento. As intenções manifestadas publicamente pelo governo espanhol, mas principalmente as verbas investidas e as obras executadas, permitem antecipar que até 2030 ou antes, linhas férreas de bitola europeia aptas para tráfego de mercadorias cheguem aos principais portos e plataformas logísticas de Espanha. Isto permitirá o transporte direto e competitivo de mercadorias entre Espanha e os restantes países da UE além Pirinéus.

Em contrapartida as soluções para as linhas ferroviárias internacionais, que supostamente irão servir o transporte de mercadorias de Portugal para a Europa no século XXI baseiam-se em remendos de linhas do século XIX com traçados em grande parte obsoletos, e em via única, ou seja, com capacidade limitada.

É entendimento do Conselho da Indústria da CIP que o investimento previsto para a modernização da Linha da Beira Alta, não a vai tornar operacional do ponto de vista da competitividade exigida para o transporte de mercadorias, nomeadamente porque o troço é desadequado. Uma orografia com pendentes (inclinações) elevadas e curvas apertadas que limitam a velocidade máxima de comboios com 750 metros (exigidos pela Comunidade Europeia para que a linha seja integrada na Rede Principal), e que são incompatíveis com as condições de interoperabilidade impostas pela União Europeia.

Recorde-se aliás, os resultados obtidos por Portugal na captação dos fundos comunitários CEF (‘Connecting Europe Facility’), com o país a captar apenas 150 milhões de euros, quando estimava angariar 1.250 milhões. Uma das razões para este fiasco foi o facto de, entre 2011 e 2015 o país não ter desenvolvido projetos ferroviários de acordo com os critérios de elegibilidade da União Europeia, sendo um dos quais a introdução de condições de interoperabilidade. Assim, o Conselho da Indústria da CIP recomenda fortemente que se desenvolvam desde já os projetos das linhas férreas internacionais em bi-bitola, sem esquecer a adaptação dos respetivos traçados, desenvolvendo-os o mais possível para maximizar as probabilidades de sucesso a novas candidaturas a Fundos da União Europeia.

É indispensável para o futuro da competitividade da economia nacional que os decisores políticos não repitam os erros de planeamento do passado, nomeadamente ao nível das infraestruturas de transporte, como foi o caso do aeroporto da Ota, que seria construído devido à saturação do aeroporto Humberto Delgado mas que se aturaria ele próprio após 23 anos de funcionamento (de acordo com o próprio Governo que se propunha lançar a obra).

É ainda essencial que o Governo não ignore a opinião de grande parte dos agentes económicos exportadores nacionais. Recorde-se as afirmações da Renova, no último inquérito realizado pela CIP, em relação à ausência de soluções de futuro de transporte terrestre competitivo: “As empresas portuguesas que quisessem continuar a exportar inevitavelmente teriam que deslocalizar a sua produção para outros países europeus que dispusessem de alternativas competitivas de transporte terrestre de mercadorias na ligação aos principais mercados europeus”.

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