Leia aqui o artigo de opinião desta semana assinado por António Saraiva na sua coluna semanal do Dinheiro Vivo, ao sábado.
Publicado no Dinheiro Vivo, edição de 21.09.2019

https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/as-mensagens-de-mario-draghi/

Na penúltima reunião de política monetária antes de abandonar o cargo de Presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi mostrou, mais uma vez, coragem e determinação em assumir decisões e apontar responsabilidades.

Apesar da crescente oposição à política de taxas de juro negativas e de regresso ao plano de compra de ativos, o BCE atuou em ambas as frentes, com um pacote de estímulos que pretende responder a uma Europa em abrandamento económico, com vários países às portas da recessão, e aos riscos que continuam a avolumar-se no horizonte.

As críticas não se fizeram esperar, mesmo da parte de alguns governadores de bancos centrais, levando Olli Rehn (do Banco Central da Finlândia) a apelar à contenção, dizendo que “é importante que mantenhamos a unidade nas aparições públicas”.

Contra a opinião de alguns dos membros do Conselho do BCE, Mario Draghi entendeu que era tempo de agir, contrastando, mais uma vez, com a inação por parte da generalidade dos governos europeus. Como afirmou, para além da política monetária expansionista do BCE, pouco mais houve que tivesse contribuído para a recuperação da economia europeia.

Por isso, levantou a voz para defender que chegou a hora da política orçamental assumir o comando. E, respondendo às objeções sobre a eficácia da política monetária e os efeitos colaterais negativos das baixas taxas de juro, foi claro: se a política orçamental tivesse sido acionada, esses efeitos colaterais seriam muito menores, o impacto das decisões de política monetária seria muito mais rápido e a necessidade de manter as medidas tomadas seria reduzida.

A bola está, agora, claramente, na mão dos governos. O recado foi deixado em especial aos países que têm espaço orçamental, que devem agir de forma eficaz e oportuna. Aos países onde a dívida pública é alta, foi recomendada prudência. Mas a todos, sem exceção, foi repetida a mensagem para intensificar os esforços no sentido de adotarem finanças públicas com uma composição mais favorável ao crescimento.

Esta mensagem é certeira no caso português, onde, como já aqui defendi, a política orçamental deve ser redirecionada, invertendo a tendência de aumento da carga fiscal, assegurando um enquadramento mais atrativo para o investimento privado, apostando nos investimentos públicos estruturantes de que o país carece e gerando margem de manobra do lado da despesa corrente.

Não nos podemos resignar, nem na Alemanha, nem em Portugal, nem em nenhum outro país, ao discurso de alguns, como o Presidente do Bundesbank, que persistem em manter  que “a situação económica não é assim tão má” e “o que importa é que estamos no caminho certo”.

Abandonemos a cegueira que, também em Portugal, nos faz esperar pelo pior para, só então, passar à ação.